Resumo
No conflito do cenário mundial atual entre fé e
obediência o, então Cardeal Ratzinger (Bento XVI), em um pronunciamento datado
do ano de 1988, já parecia aludir de certa forma a crise que se instalaria no
cristianismo um pouco mais tarde, com uma força surpreendente e aparentemente
sem precedentes. Em seu discurso poder-se-á mais uma vez tomar consciência
donde vem algumas armadilhas e de como conseguir combate-las, mas
principalmente de como manter nossa principal poder intacto: A Esperança.
Por: Joseph Ratzinger (Bento XVI)
(Janeiro de 1988)
A Fé é Obediência. Obediência significa que nós
redescobrimos a imagem essencial do nosso ser – a criaturalidade – e com isso
nos tornamos verdadeiros. Significa que reconhecemos a relação de
responsabilidade como forma fundamental da nossa vida e com isso o poder se
converte de ameaça em esperança.
Essa obediência diz respeito ao próprio Deus.
Mas para que nossa obediência seja realmente concreta e Deus não venha a ser
confundido com as projeções de nossos desejos, o próprio Deus se faz concreto
de diversas maneiras. Primeiramente na sua Palavra. Assim, a obediência à Deus
é uma obediência à Sua Palavra. Devemos nos aproximar da Bíblia com aquele
espírito de temor e obediência que nos últimos tempos esta correndo o risco de
ser perdido. Quando cada um, individualmente ou em grupo, cria sua própria
bíblia com a ajuda da classificação das fontes e da crítica da tradição, em
oposição à totalidade da Escritura e da Igreja, isto não é mais obediência a
Deus mas apoteose da própria posição com a ajuda de uma montagem de textos, na
qual as escolhas e as omissões se fundamentam sobre as próprias posições
preferidas.
[…] Hoje a Escritura é frequentemente usada,
inclusive por católicos, como uma arma contra a Igreja. Certamente, como
Palavra de Deus, a Escritura está acima da Igreja, que deve deixar-se guiar e
purificar por ela. Mas ela não está fora do Corpo de Cristo: uma leitura
privada nunca pode penetrar na sua essência mais íntima e específica. Uma
leitura correta da Escritura pressupõe que nós a leiamos onde ela fez e faz
história, onde ela não é testemunha do passado, mas força viva no presente: na
Igreja do Senhor, com os seus olhos, os olhos da fé. Neste sentido, a
obediência à Escritura é sempre obediência à Igreja; caímos na abstração se
procurarmos desligar a Igreja da Bíblia ou usá-la contra ela.
Com isso chegamos a outro aspecto do tema da
obediência: a obediência à Igreja. Aceitá-la tornou-se, hoje, particularmente
difícil para nós. […] As grandes Igrejas se apresentam à consciência moderna
como enormes aparatos de poder anônimo que parecem mais um perigo que uma
esperança. […] E também verdade que os últimos 20 anos trouxeram para Igreja
uma institucionalização exagerada e por isso preocupante. O desejo de
participação, em si justo, criou novas formas organizativas de modo que, aos
poucos, alguém que quer viver simplesmente como cristão na sua Igreja e quer
nela somente a comunhão da palavra e dos sacramentos se sente deslocado. Uma
Igreja na diáspora é, sob este ponto de vista, mais feliz, porque não pode
inflar-se como acontece sobretudo no mundo ocidental. Aqui nos encontramos
realmente diante de uma confusão de competência que suscita quase
necessariamente um sentimento de incompreensão e de impotência e pode
facilmente alterar a visão do essencial.
O específico da Igreja não é que nelas existam
pessoas simpáticas, o que de resto é desejável e acontecerá sempre. O exclusivo
é sua exusia: a ela são dados força e poder para pronunciaras
palavras da salvação, para realizar ações de salvação das quais o homem tem
necessidade e que não tem a capacidade para realizar por si mesmo. Ninguém pode
se apropriar do “Eu” de Cristo ou do “Eu” de Deus. Com este EU fala
o sacerdote quando diz: “Isto é meu corpo” e quando diz: “eu
te absolvo dos teus pecados”. Ele só pode fazê-lo por força daquele Poder
que o Senhor deu à Sua Igreja. Sem esse poder ele é apenas um agente social e
nada mais. Se as palavras do Poder que vem de Deus não são mais pronunciadas e
se não permanecem firmemente ancoradas no seu fundamento, o calor humano do
pequeno grupo não adianta muito.
Sábado 9 de Julho, catedral de Desdren, Alemanha
Oriental, onde fala da justa aproximação à Sagrada Escritura e da Obediência à
Igreja.
Fonte: Ser Cristão na Era Neopagã – volume 1:
Discursos e Homilias (1986-1999) Cardeal Joseph Ratzinger. 1º Edição. Novembro
de 2014.
Organizado por: Ivanildo
Oliveira
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