A SUCESSÃO APOSTÓLICA NA IGREJA ANGLICANA. QUESTÃO DAS
ORDENAÇÕES ANGLICANAS SEGUNDO LEÃO XIII
Por Prof. Dr. Rafael
Vitola Brodbeck | Fonte: Perfil Oficial no Face
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A Sucessão Apostólica é a linha que liga um
Bispo validamente sagrado a um dos Apostólos. Tal linha se dá através do
sacramento da Ordem em seu máximo grau, o episcopado.
Ora, todo sacramento tem matéria, forma,
ministro e intenção. Para que a Igreja Anglicana, pois, tenha um legítimo
sacramento da Ordem, e, portanto, um verdadeiro episcopado, para inserir-se na
Sucessão Apostólica, precisamos analisar o rito pelo qual os anglicanos
pretendem conferir as ordenações.
É possível que nos primórdios, a Igreja
Anglicana, que era apenas um cisma, conservasse a Sucessão Apostólica e a tenha
passado adiante. Possuía verdadeiros Bispos, e eles sagraram outros segundo o
rito romano levemente alterado para receber fórmulas do antigo rito celta (ou
uso de Sarum). Nesse rito, estavam previstas a forma e a matéria autênticas, e
o ministro era válido (um Bispo), bem como havia ainda a intenção de, pela
Ordem, dar sacerdotes à Igreja. Era apenas um cisma, não uma heresia.
Com o novo Ordinale do rei Eduardo VI,
composto por Thomas Cranmer, as coisas se modificaram. Ainda existiam Bispos
válidos (em cisma, ilícitos, mas válidos), e talvez alguns até tivessem a
intenção de dar sacerdotes pela Ordem. Todavia, não estava mais previstas, no
novo rito, a forma válida. Mais ainda: a própria intenção de, pela Ordem,
conferir o sacerdócio, não estava presente em todos os Bispos ordenantes, de
vez que a heresia protestante dominava boa parte da Igreja Anglicana da época.
O rito, aliás, como por exemplo, a ausência da entrega dos instrumentos
propriamente significantes do sacerdócio (cálice e patena), não permitia
concluir haver intenção de fazer o que a Igreja Católica quer com a ordenação.
Assim, havia dois grupos: o dos Bispos que
tinham mentalidade católica e o dos que tinham mentalidade protestante. Os
Bispos “católicos” não ordenavam validamente por defeito de forma. Os Bispos
“protestantes” não ordenavam validamente por defeito de forma, e também de
intenção.
Portanto, dessa geração de Bispos válidos, a
Sucessão Apostólica não passou. Os Bispos válidos não puderam conferir
verdadeiro sacerdócio aos seus ordenandos. A linha da Sucessão se perdeu.
Com a morte do último Bispo válido da Igreja
Anglicana, ela perdeu a Sucessão Apostólica.
Em conseqüência, a partir de então, nem mais
Bispos válidos tiveram. E, assim, além dos defeitos de forma, e intenção, outro
se lhe juntou: o de ministro.
Com o tempo, algumas reformas foram feitas na
liturgia anglicana e alguns defeitos de forma foram supridos em certos livros
litúrgicos. Contudo, resta ainda o problema da intenção e do ministro, de vez
que grande parte do anglicanismo não só não acredita no sacerdócio hierárquico,
como também não tem intenção de ordenar sacerdotes, mas meros pregadores,
ministros religiosos, administradores de sacramentos) e também porque perderam
o episcopado.
Enfim, não há Sucessão Apostólica na Igreja
Anglicana por defeito de forma (mesmo que alguns usem ritos nos quais ela é
suprida, isso não é maioria), de intenção (ainda que alguns ramos
anglo-católicos da High Church tenham verdadeira intenção de dar sacerdotes,
essa crença não é geral, até porque os 39 Artigos de Religião têm uma
compreensão distinta), e de ministro (ainda que tivessem válida forma, válida
matéria, e válida intenção, faltam-lhes válidos Bispos para “passar adiante” a
Sucessão).
Não foi outra a conclusão da Bula Apostolicae
Curae, de Leão XIII:
“Por isto, e aderindo estritamente, neste
caso, aos decretos dos pontífices, nossos predecessores, e confirmando-os mais
completamente, e, como o foi, renovando-os por nossa autoridade, de nossa
própria iniciativa e de conhecimento próprio, pornunciamos e declaramos que as
ordenações conduzidas de acordo com o rito Anglicano foram, e são,
absolutamente nulas e totalmente inválidas.” (Papa Leão XIII, Bula Apostolicae
Cureae, 36)
Essa foi sempre a posição da Igreja Católica,
historicamente aferível. “O defeito de forma, no Ordinale eduardino, foi uma
das razões mais fortes que determinou a decisão de Leão XIII contra a validez
das ordenações anglicanas; defeito de forma que, como em seguida se vê, reflete
um defeito de intenção. A razão que levou Leão XIII a não reconhecer como
válidas – por defeito de forma – as ordenações anglicanas é substancialmente a
mesma pela qual o Cardeal Legado Polo, enviado à Inglaterra nos tempos de Maria
Tudor, não reconheceu como válidas as ordenações anglicanas realizadas de 1550
a 1553, sob Eduardo VI. Só quem tivesse sido ordenado antes de 1550, isto é,
antes da composição do Ordinale eduardino, é que foi reconhecido como
verdadeiro Bispo e como verdadeiro sacerdote tanto pelo Legado Polo como pela
Rainha Maria. Quem tivesse sido ordenado segundo o Ordinale eduardino e
manifestasse o desejo de ainda se dedicar à vida sacerdotal, era re-ordenado
‘de novo et absolute’. Os casos registrados são muitos, tanto antes como depois
de 1704, ano em que essa disciplina foi declarada obrigatória pela Igreja
Católica.” (REGINA, Prof. Giuseppe. O Anglicanismo. Panorama histórico e
síntese doutrinária, São Paulo: Paulinas, 1960, p. 191)
Embora a decisão do Papa não seja um dogma,
por não pronunciar-se a respeito de uma sentença revelada, foi uma proclamação
infalível. Trata-se, pois, de um típico caso de “fato dogmático”, ou seja uma
verdade não de fé, mas de fato, que não foi revelada mas está necessariamente
em conexão com a Revelação. E, como tal, é parte do Magistério infalível, uma
verdade de fide ecclesiastica.
Ainda assim, é possível que alguns
anglicanos, hoje, tenham ordens válidas, tendo buscado uma Sucessão Apostólica
com ortodoxos e vétero-católicos, após a declaração de Leão XIII, sendo, então
re-ordenados de modo ilícito, porém válido.
O grupo dos vétero-católicos é heterogêneo,
podendo comportar ministros com ordens inválidas, e por isso é preciso cautela
com a Sucessão deles e dos anglicanos que neles buscaram uma validez. Tanto que
todos os anglicanos que se convertem e querem ser clérigos, são ordenados na
Igreja Católica, mesmo que digam ter Sucessão. No mínimo, uma ordenação sob
condição seria necessária.
Sobre a validade das ordens desse poucos grupos
que foram buscar Sucessão Apostólica fora do anglicanismo, a Igreja um dia
deverá se pronunciar. O fato é que tal atitude só demonstra a insegurança a
respeito de suas próprias ordens, de modo a confirmar o fato dogmático de sua
nulidade, já evidenciado por Leão XIII: se fossem válidas, qual o motivo de
buscarem novas ordens que lhes conferisse validade?
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