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II - Regra de fé
protestante
Frei Damião de Bozzano
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REGRA DE FÉ: Meio estabelecido por Nosso Senhor, para dar a conhecer ao mundo a
sua Doutrina.
No capítulo precedente demonstramos que esse meio é um magistério vivo,
autêntico, infalível, isto é, a Igreja Docente; e demonstramos também que as
fontes, onde essa igreja vai haurir os ensinamentos de Cristo, são a Divina
Escritura e a Tradição.
Os protestantes, porém, não concordam
conosco: segundo eles a única regra de fé é a Bíblia, tal qual é compreendida
por cada indivíduo, seja, ignorante ou sábio.
Portanto não há Tradição, isto é, verdades de fé ensinadas somente de viva voz;
tudo o que nosso senhor ensinou se acha na Bíblia. Nem há um magistério vivo,
infalível, que tenha direito de interpretar a Bíblia e de impor aos outros sua
interpretação: Cada qual pode interpretá-la como entender.
Vamos refutar essa doutrina.
Os protestantes dizem, em primeiro lugar, que o meio, pelo qual podemos
conhecer a doutrina de Nosso Senhor é tão somente a Bíblia.
Respondo:
__ Se assim fosse, dever-se-ia encontrar na Bíblia essa verdade, visto como
seria de suma importância conhecê-la.
É, pois, esta uma afirmação gratuita dos protestantes.
__ Se Nosso Senhor pretendesse nos deixar a Bíblia como Regra de fé, isto é,
como
meio para conhecermos a sua doutrina, deveria ter dito aos Apóstolos:
Ide, escrevei Bíblias para todas as nações; pelo contrário disse: "Ide por
todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura". (Mc 16,15).
Não foi, pois, sua intenção deixar-nos a Bíblia como Regra de fé.
E confirmou-o também com exemplo.
Com efeito, quando Saulo na estrada de Damasco, lhe perguntou: __ Senhor, que
queres tu que eu faça? __ Ele não respondeu: "Lê a Bíblia", e sim:
__ Levanta-te, entra na cidade e ai te será dito o que deves fazer. (Atos 9,7).
__ S. Paulo falava da mesma forma na sua epístola aos romanos. (Rm 10, 14).
"Sem fé, diz ele, é impossível agradar a Deus".
Mas qual o meio para chegar à fé?
A Bíblia? Não. É a pregação dos que foram enviados a pregar. E conclui:
"Logo a fé pelo ouvido e o ouvido pela palavra de Cristo."
__ De resto a própria razão nos diz que Jesus não podia deixar-nos a Bíblia
como única Regra de fé.
De fato, ele quer que todos os homens conheçam e professem a sua doutrina. Mas
se para isso, fosse necessária a leitura da Bíblia, como poderia então os
analfabetos e os que não podem comprar uma Bíblia, conhecer e professar a
doutrina de Jesus Cristo?
Todos estes (e são maior parte do gênero humano) não poderiam ser cristãos.
Não digam os protestantes que, que é bastante para os analfabetos que seus
pastores lhes leiam e expliquem a Bíblia. Essas explicações, segundo a doutrina
dos protestantes, não passam de opiniões individuais, que não tem autoridade
alguma e variam segundo o capricho de cada um. Não são a palavra de Deus, e sim
a palavra de Fulano, de Beltrano, de Sicrano.
Por isso, repito-o, se fosse verdade, como dizem os protestantes, que o único
meio, para chegarmos à fé, é leitura da Bíblia, os analfabetos nunca poderiam
ser cristãos.
Será possível que Jesus tenha estabelecido este meio para nos dar a conhecer a
sua doutrina?
Além disso, se a Bíblia fosse a única Regra de fé, como poderíamos conhecer com
certeza qual é o verdadeiro sentido dos passos difíceis?
Por exemplo: Quanto às palavras, com que Jesus instituiu à Santíssima
Eucaristia, a Igreja Católica da uma explicação, e as seitas protestantes dão,
pelo menos duzentas, cada uma sustentando que a sua é verdadeira.
Agora quem é que tem razão? Pela Bíblia é impossível resolver a questão, pois a
Bíblia é muda e a ninguém diz: Tu enxergas o verdadeiro sentido de minhas
palavras e todos os outros estão no erro.
Portanto, se a Bíblia fosse a única regra de fé, não poderíamos conhecer com
certeza o verdadeiro sentido dos passos difíceis da mesma.
Mas Jesus quer que conheçamos com certeza toda sua doutrina, todas as verdades
que Ele ensinou, tanto as fáceis, como as difíceis. É impossível, pois que nos
tenham deixado a Bíblia como Regra de fé.
Em segundo lugar dizem os protestantes que não existe a tradição: Todas as
verdades reveladas se acham na Bíblia.
Mas quais são as razões que alegam para provar essa asserção?
Ouçamo-las e vejamos quanto valem.
S. Paulo na sua 2° Epístola a Timóteo (3, 15) diz que "todas as Escrituras
são úteis e que elas podem instruir para a salvação".
Resp. __ Se o referido texto dissesse, que a Escritura só, torna o homem
instruído em todas as coisas necessárias para a salvação, então sim, a objeção
seria irrefutável; mas dizendo simplesmente:
"Todas as Escrituras são úteis e que elas podem instruir para a
salvação" não exclui que a Tradição o seja da mesma forma.
Mas replicam, __ é certo que Jesus em Mc 7,13 e Mt 15,3 rejeita a tradição
dizendo:
"E vós também, porque transgredis o mandamento de Deus pela vossa
tradição?"
"Em vão, pois me honram, ensinando doutrina e mandamentos que vem dos
homens".
Os referidos textos nada provam contra a tradição: pois Jesus rejeita as
doutrinas e os mandamentos que vêm dos homens, que são feitos pelos homens. sem
que tivessem autoridade para fazê-los.
Ora, pelo contrário, a tradição que para a qual apela a Igreja Católica e que
ela reconhece como segunda fonte de verdade revelada, não contém doutrinas e
mandamentos que vêm dos homens, mas do próprio Deus; pois a tradição no sentido
católico é: Certas verdades reveladas que Jesus Cristo e os Apóstolos ensinaram
de viva voz e não por escrito e que, por isso mesmo, não se acham na Bíblia.
Mas insistem os protestantes: "Não escreveu Moisés (Pen 4,2): "Não
acrescenteis nada ao que vos digo"? __ Não escreveu S. João no Apocalipse
(22,18) "Se alguém acrescentar uma palavra a estas coisas, que Deus faça
cair sobre ele os flagelos descritos nesse livro?" Não escreveu S. Paulo
(Gal 1,8). "Mas ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie um evangelho
diferente do que vos anunciamos, que seja anátema"?
Resp.-- Sim, escreveram tudo isto. Esses textos porém, nada provam contra a
tradição, afirmam somente que a divina Escritura não deve ser adulterada.
Como estas, assim também são as outras razões que os protestantes alegam contra
a tradição, razões nada valem em si mesmas; e por isso bem podemos dizer que é
outra afirmação gratuita dos protestantes o não existir a tradição.
Afirmação gratuita? Não só. Mas também afirmação contrária à realidade.
Com efeito, se fosse verdade que tudo o que Jesus e os apóstolos ensinaram se
acha na Bíblia e que, consequentemente, não existe tradição, na Bíblia
deveríamos encontrar quantos e quais são os livros inspirados, pois são ambas
verdades reveladas.
Mas onde se encontram?
Já dirigi esta pergunta a um pastor protestante e como resposta alegou ele o
texto:
"Toda a Escritura divinamente inspirada é útil para ensinar, para
repreender, para corrigir, para formar na justiça (II Tim 3, 16 ).
Ora, cada qual pode ver que o texto acima não vem ao caso. Se S. Paulo tivesse
dito:
"Toda Escritura que se compõe de tais livros e tantos livros etc."
então sim, poderíamos por esse texto conhecer quais e quantos são os livros,
que compõe a Bíblia. Mas tendo dito simplesmente "Toda escritura
divinamente inspirada é útil, etc." é necessário procurar em outra parte
quais e quantos são os livros inspirados. Onde?
Na Bíblia? Não, na Bíblia não figuram estas duas verdades. Devemos procurá-las
na tradição; só ela diz quais e quantos são os livros inspirados; e portanto,
existem verdades reveladas que não se acham na Bíblia, que é como dizer: A
tradição existe.
Poderíamos também acrescentar que a afirmação dos protestantes, além de ser
gratuita é contrária à realidade, é também contrária aos ensinamentos claros da
Bíblia, visto que a Bíblia fala em tradição.
Dispenso-me, porém, de alegar textos como prova disto, tendo-os alegado na
exposição da tese católica.
Por fim dizem os protestantes que cada qual tem o direito de interpretar a
Bíblia conforme entender.
Mas também isto como podem demonstrá-lo?
Sei que alegam as palavras que lemos no cap. 5, 39 de S. João: "Examinai
as Escrituras, pois julgais ter nelas a salvação..."
Note-se, porém, que as alegam adulteradas, visto que Jesus não diz:
"Examinai as Escrituras..." e sim: "Vós examinais as
Escrituras..." Portanto estas palavras não contem uma ordem, como querem
os protestantes, mas apenas indicam, enunciam um fato. Os hebreus não queriam reconhecê-Lo
como o enviado de Deus; então Jesus, para lhes mostrar que era verdadeiramente
o Messias, apela para o testemunho do Pai, para o testemunho de S. João
Batista, para o testemunho das obras que cumpriu e, por fim como argumento ad
hominem, diz: "Vós examinais as Escrituras, julgando ter nelas a salvação,
pois bem, são elas que dão testemunho de mim".
Qualquer pessoa pode reconhecer que Jesus aqui a ninguém impõe um preceito de
ler as Escrituras e de interpretá-las como entender.
Bem longe de dar esse direito, reprova-o pela boca de S. Pedro.
De fato S. Pedro (II Epis 1, 19 ) depois de ter recomendado... etc.. a leitura
e a meditação da Sagrada Escritura, acrescenta logo que ninguém deve ter a
pretensão de a interpretar por autoridade própria. Tendo a Deus por autor só
Deus pode explicar o seu verdadeiro sentido.
De que maneira o explica? por meio de sua Igreja, como provamos na tese
católica.
O que é confirmado também pelo exemplo que lemos nos Atos dos Apóstolos (Cap.
15). Os judeus e os habitantes da Antioquia, fiando-se na sua própria razão,
julgavam a circuncisão necessária. Saulo e Barnabé pensavam de outro modo.
Apelaram para o livre exame, ou para a Bíblia interpretada por particulares?
Não.
Enviaram uma deputação, com Saulo e Barnabé, para consultar os pastores da
Igreja em Jerusalém e estes decidiram a questão sob a inspiração do Espírito
Santo.
__ Mas não é preciso acrescentar argumentos, para provar que os protestantes
não
tem razão em sustentar que cada qual tem o direito de explicar a Bíblia como
entender: o próprio bom senso repele esse absurdo.
Explicar-me-ei com uma comparação:
O Brasil tem seu códigos de leis. Todos podem ler esse código.
Mas quem é que o pode interpretar autenticamente?
Por exemplo: nasce uma questão entre Fulano e Sicrano. Fulano exige para si uma
herança, interpretando de uma forma a lei do código civil; Sicrano também exige
para si a mesma herança, interpretando de outra forma a mesma lei.
Agora quem é que pode resolver a questão e dizer: A lei deve ser interpretada
assim e assim; portanto a herança pertence a Fulano e não a Sicrano?
É um pessoa qualquer ou é um Tribunal, uma autoridade legitimamente
constituída? Até um menino me responderia que é um Tribunal, visto que a razão
demonstra que, se um legislador deixasse as suas leis à livre interpretação de
todos os cidadãos, poria a desordem e a confusão no seu país.
Pois bem, a Bíblia é o código de Deus. Teria Ele deixado esse código à livre
interpretação de todos? Nesse caso seria menos sábio que qualquer legislador
humano. Sendo pelo, contrário, infinitamente mais sábio do que todos os
legisladores, a própria razão nos diz que é impossível que tenha deixado a
Bíblia à livre interpretação de todos.
__ Para melhor compreensão disto, veja-se a que tristes consequências já tem
levado no passado e ainda pode levar no futuro a livre interpretação da Bíblia.
Os anabatistas de Musnter, e depois deles muitos outros, das palavras do
Senhor:
"Crescei e multiplicai-vos" tiraram como conclusão necessária a
legitimidade da poligamia. Foi baseado, não sei em que passagem da Bíblia, que
Lutero permitiu a Filipe de Hessem ter duas mulheres ao mesmo tempo. João de
Leyde descobriu, lendo a Bíblia, que devia desposar onze mulheres ao mesmo
tempo. Hermann ali descobriu que ele era o Messias enviado por Deus. Nicolau,
que tudo o que tem relação com a fé é desnecessário, e que se deve viver em
pecado afim de que a graça superabunde: Sympson, que se deve andar nu pelas
ruas para convencer os ricos que devem ser despojados de tudo.
E, para dizermos tudo numa palavra, não há crime e abominação que não tenha
encontrado sua pretendida justificação em qualquer texto da Bíblia interpretado
pelo espírito privado, fora da autoridade tutelar da Igreja Católica.
Façamos aqui ponto e seja essa a nossa conclusão: A única regra de fé não é a
Bíblia, interpretada como cada qual entender. A única regra de fé é o
magistério da Igreja; e as fontes, onde ela vai haurir os ensinamentos de
Jesus, são a Bíblia e a Tradição.
Felizes os que seguem esta Doutrina.
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Autor: Frei Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur: Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora: Paulinas - 3 Edição - 1955
Fonte
Autor: Frei Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur: Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora: Paulinas - 3 Edição - 1955
Fonte
Livro(PDF): Frei Damião - Em Defesa da Fé
<http://alexandriacatolica.blogspot.com.br/2014/04/o-peregrino-de-deus.html>
Para citar
BOZZANO, Frei Damião. Em Defesa da Fé: II.
Regra de fé protestante. Disponível em <http://amigos-catolicos-evangelizadores.blogspot.com/2016/04/frei-damiao-de-bozzano-ii-regra-de-fe.html>
Desde 25/04/2016.
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