segunda-feira, 25 de abril de 2016

Frei Damião de Bozzano: II. Regra de fé protestante


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II - Regra de fé protestante    
Frei Damião de Bozzano
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REGRA DE FÉ: Meio estabelecido por Nosso Senhor, para dar a conhecer ao mundo a sua Doutrina. 

No capítulo precedente demonstramos que esse meio é um magistério vivo, autêntico, infalível, isto é, a Igreja Docente; e demonstramos também que as fontes, onde essa igreja vai haurir os ensinamentos de Cristo, são a Divina Escritura e a Tradição.


Os protestantes, porém, não concordam conosco: segundo eles a única regra de fé é a Bíblia, tal qual é compreendida por cada indivíduo, seja, ignorante ou sábio. 

Portanto não há Tradição, isto é, verdades de fé ensinadas somente de viva voz; tudo o que nosso senhor ensinou se acha na Bíblia. Nem há um magistério vivo, infalível, que tenha direito de interpretar a Bíblia e de impor aos outros sua interpretação: Cada qual pode interpretá-la como entender. 

Vamos refutar essa doutrina. 

Os protestantes dizem, em primeiro lugar, que o meio, pelo qual podemos conhecer a doutrina de Nosso Senhor é tão somente a Bíblia. 

Respondo: 

__ Se assim fosse, dever-se-ia encontrar na Bíblia essa verdade, visto como seria de suma importância conhecê-la. 

Ora, pelo contrário, ninguém até hoje encontrou nem jamais encontrará, porque na Bíblia não figura. 

É, pois, esta uma afirmação gratuita dos protestantes. 

__ Se Nosso Senhor pretendesse nos deixar a Bíblia como Regra de fé, isto é, como 

meio para conhecermos a sua doutrina, deveria ter dito aos Apóstolos: 

Ide, escrevei Bíblias para todas as nações; pelo contrário disse: "Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura". (Mc 16,15). 

Não foi, pois, sua intenção deixar-nos a Bíblia como Regra de fé. 

E confirmou-o também com exemplo. 

Com efeito, quando Saulo na estrada de Damasco, lhe perguntou: __ Senhor, que queres tu que eu faça? __ Ele não respondeu: "Lê a Bíblia", e sim: 

__ Levanta-te, entra na cidade e ai te será dito o que deves fazer. (Atos 9,7). 

__ S. Paulo falava da mesma forma na sua epístola aos romanos. (Rm 10, 14). 

"Sem fé, diz ele, é impossível agradar a Deus". 

Mas qual o meio para chegar à fé? 

A Bíblia? Não. É a pregação dos que foram enviados a pregar. E conclui: "Logo a fé pelo ouvido e o ouvido pela palavra de Cristo." 

__ De resto a própria razão nos diz que Jesus não podia deixar-nos a Bíblia como única Regra de fé. 

De fato, ele quer que todos os homens conheçam e professem a sua doutrina. Mas se para isso, fosse necessária a leitura da Bíblia, como poderia então os analfabetos e os que não podem comprar uma Bíblia, conhecer e professar a doutrina de Jesus Cristo? 

Todos estes (e são maior parte do gênero humano) não poderiam ser cristãos. 

Não digam os protestantes que, que é bastante para os analfabetos que seus pastores lhes leiam e expliquem a Bíblia. Essas explicações, segundo a doutrina dos protestantes, não passam de opiniões individuais, que não tem autoridade alguma e variam segundo o capricho de cada um. Não são a palavra de Deus, e sim a palavra de Fulano, de Beltrano, de Sicrano. 

Por isso, repito-o, se fosse verdade, como dizem os protestantes, que o único meio, para chegarmos à fé, é leitura da Bíblia, os analfabetos nunca poderiam ser cristãos. 

Será possível que Jesus tenha estabelecido este meio para nos dar a conhecer a sua doutrina? 

Além disso, se a Bíblia fosse a única Regra de fé, como poderíamos conhecer com certeza qual é o verdadeiro sentido dos passos difíceis? 

Por exemplo: Quanto às palavras, com que Jesus instituiu à Santíssima Eucaristia, a Igreja Católica da uma explicação, e as seitas protestantes dão, pelo menos duzentas, cada uma sustentando que a sua é verdadeira. 

Agora quem é que tem razão? Pela Bíblia é impossível resolver a questão, pois a Bíblia é muda e a ninguém diz: Tu enxergas o verdadeiro sentido de minhas palavras e todos os outros estão no erro. 

Portanto, se a Bíblia fosse a única regra de fé, não poderíamos conhecer com certeza o verdadeiro sentido dos passos difíceis da mesma. 

Mas Jesus quer que conheçamos com certeza toda sua doutrina, todas as verdades que Ele ensinou, tanto as fáceis, como as difíceis. É impossível, pois que nos tenham deixado a Bíblia como Regra de fé. 

Em segundo lugar dizem os protestantes que não existe a tradição: Todas as verdades reveladas se acham na Bíblia. 

Mas quais são as razões que alegam para provar essa asserção? 

Ouçamo-las e vejamos quanto valem. 

S. Paulo na sua 2° Epístola a Timóteo (3, 15) diz que "todas as Escrituras são úteis e que elas podem instruir para a salvação". 

Resp. __ Se o referido texto dissesse, que a Escritura só, torna o homem instruído em todas as coisas necessárias para a salvação, então sim, a objeção seria irrefutável; mas dizendo simplesmente: 

"Todas as Escrituras são úteis e que elas podem instruir para a salvação" não exclui que a Tradição o seja da mesma forma. 

Mas replicam, __ é certo que Jesus em Mc 7,13 e Mt 15,3 rejeita a tradição dizendo: 

"E vós também, porque transgredis o mandamento de Deus pela vossa tradição?" 

"Em vão, pois me honram, ensinando doutrina e mandamentos que vem dos homens". 

Os referidos textos nada provam contra a tradição: pois Jesus rejeita as doutrinas e os mandamentos que vêm dos homens, que são feitos pelos homens. sem que tivessem autoridade para fazê-los. 

Ora, pelo contrário, a tradição que para a qual apela a Igreja Católica e que ela reconhece como segunda fonte de verdade revelada, não contém doutrinas e mandamentos que vêm dos homens, mas do próprio Deus; pois a tradição no sentido católico é: Certas verdades reveladas que Jesus Cristo e os Apóstolos ensinaram de viva voz e não por escrito e que, por isso mesmo, não se acham na Bíblia. 

Mas insistem os protestantes: "Não escreveu Moisés (Pen 4,2): "Não acrescenteis nada ao que vos digo"? __ Não escreveu S. João no Apocalipse (22,18) "Se alguém acrescentar uma palavra a estas coisas, que Deus faça cair sobre ele os flagelos descritos nesse livro?" Não escreveu S. Paulo (Gal 1,8). "Mas ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie um evangelho diferente do que vos anunciamos, que seja anátema"? 

Resp.-- Sim, escreveram tudo isto. Esses textos porém, nada provam contra a tradição, afirmam somente que a divina Escritura não deve ser adulterada. 

Como estas, assim também são as outras razões que os protestantes alegam contra a tradição, razões nada valem em si mesmas; e por isso bem podemos dizer que é outra afirmação gratuita dos protestantes o não existir a tradição. 

Afirmação gratuita? Não só. Mas também afirmação contrária à realidade. 

Com efeito, se fosse verdade que tudo o que Jesus e os apóstolos ensinaram se acha na Bíblia e que, consequentemente, não existe tradição, na Bíblia deveríamos encontrar quantos e quais são os livros inspirados, pois são ambas verdades reveladas. 

Mas onde se encontram? 

Já dirigi esta pergunta a um pastor protestante e como resposta alegou ele o texto: 

"Toda a Escritura divinamente inspirada é útil para ensinar, para repreender, para corrigir, para formar na justiça (II Tim 3, 16 ). 

Ora, cada qual pode ver que o texto acima não vem ao caso. Se S. Paulo tivesse dito: 

"Toda Escritura que se compõe de tais livros e tantos livros etc." então sim, poderíamos por esse texto conhecer quais e quantos são os livros, que compõe a Bíblia. Mas tendo dito simplesmente "Toda escritura divinamente inspirada é útil, etc." é necessário procurar em outra parte quais e quantos são os livros inspirados. Onde? 

Na Bíblia? Não, na Bíblia não figuram estas duas verdades. Devemos procurá-las na tradição; só ela diz quais e quantos são os livros inspirados; e portanto, existem verdades reveladas que não se acham na Bíblia, que é como dizer: A tradição existe. 

Poderíamos também acrescentar que a afirmação dos protestantes, além de ser gratuita é contrária à realidade, é também contrária aos ensinamentos claros da Bíblia, visto que a Bíblia fala em tradição. 

Dispenso-me, porém, de alegar textos como prova disto, tendo-os alegado na exposição da tese católica. 

Por fim dizem os protestantes que cada qual tem o direito de interpretar a Bíblia conforme entender. 

Mas também isto como podem demonstrá-lo? 

Sei que alegam as palavras que lemos no cap. 5, 39 de S. João: "Examinai as Escrituras, pois julgais ter nelas a salvação..." 

Note-se, porém, que as alegam adulteradas, visto que Jesus não diz: "Examinai as Escrituras..." e sim: "Vós examinais as Escrituras..." Portanto estas palavras não contem uma ordem, como querem os protestantes, mas apenas indicam, enunciam um fato. Os hebreus não queriam reconhecê-Lo como o enviado de Deus; então Jesus, para lhes mostrar que era verdadeiramente o Messias, apela para o testemunho do Pai, para o testemunho de S. João Batista, para o testemunho das obras que cumpriu e, por fim como argumento ad hominem, diz: "Vós examinais as Escrituras, julgando ter nelas a salvação, pois bem, são elas que dão testemunho de mim". 

Qualquer pessoa pode reconhecer que Jesus aqui a ninguém impõe um preceito de ler as Escrituras e de interpretá-las como entender. 

Bem longe de dar esse direito, reprova-o pela boca de S. Pedro. 

De fato S. Pedro (II Epis 1, 19 ) depois de ter recomendado... etc.. a leitura e a meditação da Sagrada Escritura, acrescenta logo que ninguém deve ter a pretensão de a interpretar por autoridade própria. Tendo a Deus por autor só Deus pode explicar o seu verdadeiro sentido. 

De que maneira o explica? por meio de sua Igreja, como provamos na tese católica. 

O que é confirmado também pelo exemplo que lemos nos Atos dos Apóstolos (Cap. 15). Os judeus e os habitantes da Antioquia, fiando-se na sua própria razão, julgavam a circuncisão necessária. Saulo e Barnabé pensavam de outro modo. 

Apelaram para o livre exame, ou para a Bíblia interpretada por particulares? Não. 

Enviaram uma deputação, com Saulo e Barnabé, para consultar os pastores da Igreja em Jerusalém e estes decidiram a questão sob a inspiração do Espírito Santo. 

__ Mas não é preciso acrescentar argumentos, para provar que os protestantes não 

tem razão em sustentar que cada qual tem o direito de explicar a Bíblia como entender: o próprio bom senso repele esse absurdo. 

Explicar-me-ei com uma comparação: 

O Brasil tem seu códigos de leis. Todos podem ler esse código. 

Mas quem é que o pode interpretar autenticamente? 

Por exemplo: nasce uma questão entre Fulano e Sicrano. Fulano exige para si uma herança, interpretando de uma forma a lei do código civil; Sicrano também exige para si a mesma herança, interpretando de outra forma a mesma lei. 

Agora quem é que pode resolver a questão e dizer: A lei deve ser interpretada assim e assim; portanto a herança pertence a Fulano e não a Sicrano? 

É um pessoa qualquer ou é um Tribunal, uma autoridade legitimamente constituída? Até um menino me responderia que é um Tribunal, visto que a razão demonstra que, se um legislador deixasse as suas leis à livre interpretação de todos os cidadãos, poria a desordem e a confusão no seu país. 

Pois bem, a Bíblia é o código de Deus. Teria Ele deixado esse código à livre interpretação de todos? Nesse caso seria menos sábio que qualquer legislador humano. Sendo pelo, contrário, infinitamente mais sábio do que todos os legisladores, a própria razão nos diz que é impossível que tenha deixado a Bíblia à livre interpretação de todos. 

__ Para melhor compreensão disto, veja-se a que tristes consequências já tem levado no passado e ainda pode levar no futuro a livre interpretação da Bíblia. 

Os anabatistas de Musnter, e depois deles muitos outros, das palavras do Senhor: 

"Crescei e multiplicai-vos" tiraram como conclusão necessária a legitimidade da poligamia. Foi baseado, não sei em que passagem da Bíblia, que Lutero permitiu a Filipe de Hessem ter duas mulheres ao mesmo tempo. João de Leyde descobriu, lendo a Bíblia, que devia desposar onze mulheres ao mesmo tempo. Hermann ali descobriu que ele era o Messias enviado por Deus. Nicolau, que tudo o que tem relação com a fé é desnecessário, e que se deve viver em pecado afim de que a graça superabunde: Sympson, que se deve andar nu pelas ruas para convencer os ricos que devem ser despojados de tudo. 

E, para dizermos tudo numa palavra, não há crime e abominação que não tenha encontrado sua pretendida justificação em qualquer texto da Bíblia interpretado pelo espírito privado, fora da autoridade tutelar da Igreja Católica. 

Façamos aqui ponto e seja essa a nossa conclusão: A única regra de fé não é a Bíblia, interpretada como cada qual entender. A única regra de fé é o magistério da Igreja; e as fontes, onde ela vai haurir os ensinamentos de Jesus, são a Bíblia e a Tradição. 

Felizes os que seguem esta Doutrina.
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Autor: Frei Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur: Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora: Paulinas - 3 Edição - 1955

Fonte

Para citar
BOZZANO, Frei Damião. Em Defesa da Fé: II. Regra de fé protestante. Disponível em <http://amigos-catolicos-evangelizadores.blogspot.com/2016/04/frei-damiao-de-bozzano-ii-regra-de-fe.html> Desde 25/04/2016.

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