terça-feira, 26 de abril de 2016

Frei Damião de Bozzano: XVIII. O Santo Sacramento do Matrimônio


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XVIII. O Santo Sacramento do Matrimônio
Frei Damião de Bozzano
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Inúmeros são os abusos que devemos deplorar com relação ao matrimônio. Um dos principais é o não querer considerá-lo como um sacramento instituído por Nosso Senhor; pelo que não é raro se encontrarem uniões ilícitas também entre católicos.

Procurarei este abuso demonstrando que o matrimônio entre os cristãos é um sacramento.

O matrimônio mostra-se sagrado desde a sua primeira instituição.

Com efeito, é o próprio Deus quem desce ao paraíso terrestre e que, comovido à vista da solicitação do nosso primeiro pai, exclama: "Não é bom ficar o homem sozinho; façamos-lhe um adjutório, semelhante a ele". É Deus que, proferidas essas palavras, infunde em Adão um sono profundo, durante o que lhe tira do lado uma das costelas e forma a primeira mulher. É Deus que acordando o homem, lhe apresenta aquela que deverá ser a sua inseparável companheira e lhe inspira este cântico nupcial: "Eis aqui agora o osso de meus ossos e a carne de minha carne. Esta se chamará Virago, porque de varão foi tomada. Por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe e se unirá a sua mulher e serão dois numa só carne". É Deus em suma, que desde o princípio dos tempos, instituiu o matrimônio e, por meio das palavras inspiradas a Adão, promulga a sua indissolubilidade.

Em seguida, depois da prevaricação dos nossos primeiros pais, o matrimônio não tardou a decair da sua primitiva santidade, conservando, todavia, o caráter de coisa sagrada, pois, era sempre ao pé dos altares e diante dos sacerdotes que os bons iam se casar.

Vindo, porém, Nosso Senhor Jesus Cristo a este mundo, não somente reconduziu o matrimônio à sua primitiva santidade, mas também o elevou a dignidade de sacramento. Eis as provas.

A primeira nos é oferecida pelo apóstolo S. Paulo, que na sua Epístola aos Efésios (5, 32), falando da união do homem com a mulher, diz: Este sacramento é grande, mas eu digo que é grande em Jesus Cristo e na sua e na sua Igreja. Isto quer dizer que o matrimônio é, na Nova Lei de Jesus Cristo e na sua Igreja um grande sacramento.

Sei que os protestantes põe a palavra — mistério — em lugar da palavra — sacramento — nesta passagem de S. Paulo; mas da no mesmo. Com efeito, que mistério haveria no matrimônio, se não fosse ele sacramento? Seria um contrato natural como todos os outros e nada mais. Além disso se o matrimônio não fosse um sacramento, como poderia o apóstolo afirmar que "é maior em Jesus Cristo e na sua Igreja, do que o era em outras épocas?"

Cumpre pois, afirmar, mesmo admitindo a tradução protestante, que a Sagrada Escritura nos ensina que o matrimônio é um sacramento.

A este testemunho da Bíblia faz eco o de todos os séculos do cristianismo. Os protestantes vão dizendo que apenas no século XII se começou a ensinar na Igreja que o matrimônio é um sacramento. É, porém, uma das muitas calúnias, que eles levantam contra nós. Não, desde o tempo dos Apóstolos, os cristãos sempre reconheceram o matrimônio como sacramento.

Vejamo-lo:

Consta que a Igreja greco-cismática, que se separou da Igreja romana no ano de 870, acredita como nós, no matrimônio como sacramento. Ora, é impossível que ela tenha recebido essa crença da Igreja Romana depois da separação, considerada a tenacidade com que sempre manteve as suas tradições e a aversão com que sempre mostrou para com os católicos latinos.

Logo, este acordo entre Igreja Romana e a grega, com relação ao matrimônio como sacramento, é anterior à separação, isto é, anterior ao século IX.

É igualmente anterior ao século V?

Sim, pois as seitas orientais da Ásia: a nestoriana, a monofisita, a copta, e a armênia, que se separaram da Igreja católica naquele século, sempre acreditaram e acreditam, como nós, no matrimônio como sacramento. Ora, isto é uma prova de que mesmo antes da separação concordavam neste ponto com a Igreja católica. Do contrário, como explicar este acordo? Todas aquelas seitas hostis à Igreja Romana, depois da separação por certo nunca teriam recebido desta uma prática desconhecida.

Para melhor compreensão deste argumento suponhamos, por exemplo, que a nossa Igreja inventasse hoje uma nova doutrina e dissesse a todo o mundo que deveria ser abraçada como verdade revelada por Nosso Senhor: abraçá-la-iam, porventura, os protestantes? Bem longe disso, bradariam alto contra a Igreja.

O mesmo diga-se em nosso caso. Se a nossa Igreja, depois que as seitas orientais dela se separaram, tivesse inventado que o matrimônio é um sacramento instituído por Nosso Senhor, estas seitas nunca teriam abraçado semelhante doutrina. Se, pois, como nós, admitem que matrimônio é um sacramento, quer isso dizer que esta doutrina já se ensinava antes do século V, época em que se deu a separação.

Ensinou-se também nos quatro primeiros séculos do cristianismo? Ensinou-se, disto são testemunhas os Padres e Doutores da Igreja.

Sto. Agostinho que viveu no século IV e parte do século V (+ 430), no seu livro intitulado — De bono conjugii — escreve: "No casamento das nossas mulheres, a santidade do sacramento é de máxima importância". E mais ainda: "Entre as outras nações o grande bem do casamento consiste na geração dos filhos e na fidelidade dos cônjuges. Mas entre os cristãos há, além de tudo isto, a santidade do sacramento (cap. 24 ).

No século IV, Sto. Ambrósio assim se exprimia a respeito do matrimônio: "Há um grande sacramento na união do homem com a mulher". (Livro I sobre Abraão). E S.

Cirilo acrescenta: "Jesus Cristo santificou o matrimônio e lhe conferiu uma graça"(com. em S. João cap. 2).

No século III Orígenes, no seu comentário em São Mateus, declara expressamente que o matrimônio é um sacramento. (I cap. 14).

No século II é Santo Irineu, que nos repete a mesma doutrina, dizendo: "É preciso meditar muito sobre o sacramento do matrimônio". (Liv. I contra as heresias).

E nota-se: Este testemunho de Santo Irineu tem, para nós, suma importância, porque foi discípulo de São Policarpo, e esse, por sua vez, o foi de São João apóstolo; podia, pois, Santo Irineu conhecer qual a doutrina ensinada pelos apóstolos a respeito do matrimônio.

Finalmente no século I — Sto. Inácio, contemporâneo dos apóstolos, na sua epístola a Policarpo (cap. 5) escreve: "Os esposos convêm que se unam por sentença do Bispo, afim de as núpcias serem segundo o Senhor e não segundo às paixões".

É, pois, certo que a cristandade sempre considerou o matrimônio como um sacramento desde os tempos dos apóstolos. Pelo que é preciso concluir que esta doutrina lhe foi ensinada pelos próprios apóstolos e, por conseguinte, pelo próprio Jesus Cristo.

E, de resto, que se entende por sacramento? Entenda-se um sinal sagrado produtivo da graça. Ora o matrimônio é um sinal sagrado, pois, no dizer de São Paulo (Ef. 5, 24), a união do homem com a mulher representa a união de Jesus Cristo com a sua Igreja. É um sinal produtivo da graça, pois a união de Jesus com a sua Igreja, não é apenas uma união de amor porém, uma união de graça, por conseguinte, tal há de ser também a união do homem com a mulher, isto é, o matrimônio.

Logo, nada lhe faltando do que constitui a essência do sacramento, é preciso reconhecê-lo como tal.

Com muita razão, pois, o concílio de Trento declara que é herege excomungado quem se atreve a negar que o matrimônio é um dos sete sacramentos instituídos por Nosso Senhor.

E agora se me permita fazer uma aplicação desta doutrina à vida prática: Se o matrimônio é uma coisa sagrada, ou melhor, um sacramento, a que autoridade deverá estar sujeito? As coisas sagradas estão sujeitas tão somente a Deus e àquela autoridade que Ele constitui sua legítima representante na terra, isto é, a Igreja.

Se, pois, o matrimônio é uma coisa sagrada, ou melhor, um sacramento, só à Igreja esta sujeito, e só ela pode administrá-lo validamente.

Daí, porém, não se deve concluir que o contrato civil não seja lícito, pelo contrário, afirmo que um católico não somente pode, mas deve também fazê-lo para assegurar a si mesmo e a seus filhos a proteção das leis. O que não é lícito é o seguinte: Fazer somente o contrato civil e deixar de lado o contrato religioso; ou fazer hoje o contrato civil e depois de um mês, um ano, cinco anos, o contrato religioso, isto sim, não é lícito; é repudiar a religião de Nosso Senhor Jesus Cristo. O contrato civil não une as almas, não une os corpos; une apenas os bens. Um homem para poder viver honestamente diante de Deus com uma mulher, tem que fazer o contato religioso.

Contratando-se apenas no civil, peca, não pode esperar a benção de Deus e, morrendo naquele estado, não se salva.

Mas, se pode dizer: Não sei porque o casamento religioso é tão importante. Com efeito, é somente uma formalidade exterior. E é também uma formalidade exterior se contratar o casamento diante do oficial civil. Não é suficiente? (Cfr. Thiamer Toth).

Seguramente não: Isto não basta. Quem fala desta maneira não tem ideia alguma do matrimônio cristão.

No matrimônio cristão, dois cristãos se entregam inteiramente um ao outro sem reserva.

Ora, os cristãos, segundo a fé, quando receberam o batismo não somente foram mudados do pecado original, não somente obtiveram a graça santificante, mas também se tornaram membros do Corpo Místico de Jesus Cristo, propriedade de Jesus Cristo. Por isso quando querem contratar casamento e quando querem se entregar um ao outro não podem fazê-lo sem Jesus Cristo. O seu casamento não terá validade, se também Jesus Cristo não der o seu consentimento, isto é, se não se casarem diante do altar de Jesus Cristo.

Eis porque é necessário casar-se diante da Igreja.

Efetivamente não se pode conceber que um cristão ouse abraçar o estado matrimonial sem ter pedido a graça de Jesus Cristo, isto é, sem se casar na Igreja. Vais viajar? faze uma prece — diz um provérbio; Vais por mar? faze duas preces. Vais casar? faze cem preces.

Sim, a vida de uma família exige um grande sacrifício; e o lugar do sacrifício é o altar. Só Cristo imolado no altar pode ensinar a suportar o sacrifício exigido pela vida familiar. Aqui esta porque Nosso Senhor deu ao matrimônio a dignidade de sacramento, aqui está, porque ele dirige os primeiros passos dos noivos para o altar, afim de que do altar jorre sobre eles a graça necessária para cumprirem os deveres próprios do estado matrimonial.
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Autor: Frei Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur: Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora: Paulinas - 3 Edição - 1955

Fonte

Para citar
BOZZANO, Frei Damião. Em Defesa da Fé: XVIII. O Santo Sacramento do Matrimônio. Disponível em <http://amigos-catolicos-evangelizadores.blogspot.com/2016/04/frei-damiao-de-bozzano-xviii-o-santo-sacramento-do-matrimonio.html> Desde 26/04/2016.

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