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XXVI – Purgatório
(+ Índice do livro)
Frei Damião de Bozzano
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Purgatório é o estado,
ou antes, o lugar em que as almas dos justos, saídas deste mundo, sem terem
satisfeito perfeitamente suas culpas, acabam de expiá-las antes de serem
admitidas ao céu.
— A existência do
Purgatório é verdade de fé. De fato, no II livro dos Macabeus, lemos que Judas,
depois de renhido combate, em que sucumbiu uma grande multidão de guerreiros,
fez uma coleta e mandou 12 mil dracmas de prata a Jerusalém para que fosse
oferecido a Deus um sacrifício expiatório pelos pecados dos mortos. Depois de relatado
este fato, o historiador sagrado acrescenta: "Portanto, santo e salutar é
o pensamento de rezar pelos defuntos, afim de que sejam absolvidos dos seus
pecados". (II Mac. 12, 46).
Esta passagem nos dá o
direito de concluir que entre o céu e o inferno há um lugar de expiação. Com
efeito, as almas que estão no céu não têm necessidades das nossas orações, as
que estão no inferno não podem, pelas mesmas, receber este alívio.
Portanto deve haver um
terceiro lugar, em que as nossas orações sejam úteis às almas que nele se
encontram, lugar que nós, católicos, chamamos de Purgatório.
Mas dizem os
protestantes, os dois livros dos Macabeus são apócrifos, não pertencem à Divina
Escritura.
Quem os declarou
apócrifos foram Lutero e Calvino. Mas a Igreja Universal os considerou sempre
como autênticos e divinos e como tais tem sido citados pelos SS. Padres mais
antigos: por isto Sto. Agostinho pode dizer: "A Igreja de Deus tem reconhecido
sempre os livros dos Macabeus como livros canônicos, isto é, como pertencentes
à Divina Escritura". (Cid. de Deus 36).
Contudo, dado é
concedido que estes dois livros não sejam divinos, o texto aludido decide
admiravelmente a favor do Purgatório; pois mostra claramente que o povo judaico
cria no Purgatório e que, para sufragar as almas dos mortos, não só recorria às
súplicas e orações, mas também oferecia sacrifícios no templo e instituíra para
este fim ritos solenes; o que não podia fazer, não teria feito, se isto não
tivesse aprendido por Divina Revelação.
Mas citemos os textos
que também se acham na Bíblia protestante.
No Evangelho de S. Mt.
(cap. 12, 32) Jesus diz: "Aquele que disser uma palavra contra o Filho do
Homem ser-lhe-á perdoado, mas ao que falar contra o Espírito Santo, não lhe
será perdoado nem neste século, nem no futuro".
Pela distinção
estabelecida nestas palavras de Jesus, é evidente que há pecados que são
perdoados neste século, isto é, neste mundo e no outro mundo.
Mas onde serão
perdoados? no céu? Não, pois, lá o pecado não pode entrar. No inferno? Tão
pouco, porque aí não há mais perdão nem remissão. Onde então? Num lugar
diferente do céu e do inferno e que nós, os católicos chamamos de Purgatório.
Ainda no Evangelho de
S. Mt. (5, 26) Jesus diz: "Reconcilia-te com teu adversário... enquanto
estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao
Juiz e o Juiz te entregue ao ministro e te encerrem na prisão. Em verdade te
digo, que de modo algum sairás de daí, enquanto não pagares até o último
ceitil".
Qual esta prisão de
onde uma alma só poderá sair depois de ter pago o último ceitil?
O céu não é, pois o
céu não é uma prisão.
O inferno também não
é, pois ninguém sai do inferno.
Não é uma prisão
terrena, pois com um advogado, protetores e amigos se retira da cadeia até
mesmo um criminoso ou, pelo menos, se lhe pode diminuir a pena.
Qual será então?
É o Purgatório, ou
lugar de expiação, onde a alma expia suas faltas, purifica-se das suas
derradeiras manchas, antes de entrar no céu.
— S. Paulo na sua 1a.
Epístola aos Coríntios diz: "O fogo provará as obras de cada homem.
Aquele, cuja obras subsistirem, será recompensado; aquele cujas obras forem consumidas,
ficará prejudicado, contudo será salvo, mas pelo fogo". (3, 13-16).
O fogo de que fala
aqui o Apóstolo, não pode ser o que há de abrasar o mundo antes do último
juízo, porque esse fogo não provará as obras de quem quer que seja e agirá
indiferentemente sobre os bons e os maus.
Não pode ser o do
inferno porque esse é eterno, nem pode salvar.
Logo, é o fogo de
outro lugar que chamamos Purgatório.
O mesmo Apóstolo na
sua epístola aos Filipenses (2, 10) diz: "Ao nome de Jesus todo joelho se
dobra no céu, na terra, e debaixo da terra". Por aqueles que "estão debaixo
da terra" designa o Apóstolo não os corpos dos finados, mas as almas dos mortos
que não se acham no céu. Estas almas ou estão no Purgatório ou estão no inferno.
Impossível, porém, que
se refira às que estão no inferno, porque bem sabia que no inferno não se dobra
o joelho ao nome de Jesus. Refere-se, pois as que estão no Purgatório.
S. João (Apoc. 21, 27)
diz, falando do céu:
"Nada manchado lá
entrará".
Ora, façamos uma
suposição: morre de improviso um justo, que tem cometido apenas algum ato de
impaciência.
Para onde irá a sua
alma? Para o céu? Não, porque está manchada por aquele ato de impaciência.
Para o inferno?
Também não, porque um
pequeno ato de impaciência não merece uma pena eterna.
Para onde irá então?
Para um lugar intermediário entre o céu e a terra, que se chama Purgatório.
A este testemunho das
divinas Escrituras faz eco o de todos os séculos do cristianismo.
Os protestantes dizem
que o Purgatório teve origem no século VI, com Gregório, o Grande.
Ao que respondemos:
mentem. A palavra é um pouco dura, mas merecida. Com efeito, em todos os
séculos anteriores ao VI se conheceu o Purgatório. Eis as provas:
No século V Sto.
Agostinho assim escrevia no seu livro intitulado — As confissões: — "Senhor,
dignai-vos de perdoar a minha mãe. Lembrai-vos de que, estando ela para morrer
não pensou no corpo, não pediu as honras fúnebres. Tudo quanto ela desejou, foi
que se fizesse memória dela no Santo Altar, onde sabia que se oferece a Santa Vítima
que apaga e destrói a cédula da nossa condenação". (Liv. 9 cap. 13).
No mesmo século S.
Jerônimo na sua carta a Pamáquio dizia: "É costume cobrir de flores o túmulo
das mulheres; mas seguistes um uso melhor derramando sobre o túmulo da vossa
esposa algumas moedas para o alívio da sua alma".
No século IV, S. João
Crisóstomo assim falava a respeito das almas do Purgatório:
"As lágrimas dos
vivos não são inúteis aos mortos; as orações e as esmolas os aliviam (Rom I,
Ep. ad Cor).
E S. Cirilo de
Jerusalém, explicando a liturgia, dizia: "Em seguida oramos pelos defuntos,
sabendo pela fé que a oração é muito útil para as almas, pelas quais se oferece".
(Catc. 23, 9).
No século III S.
Cipriano, Bispo de Cartago, ensinava claramente: "Além do túmulo existem
para as almas três estados distintos: O céu, para onde sobem os Santos; o inferno
para onde descem os pecadores impenitentes, e o Purgatório, onde são purificados
pelo fogo os predestinados ainda imperfeitos".
E com a mesma clareza
acrescenta: "Há uma notável diferença entre subir ao céu imediatamente
depois da morte, e lá chegar depois de uma demora, mais ou menos longa, nas penas
expiatórias do Purgatório". (Epístolas 52s e 56a).
No século II
Tertuliano, depois de ter referido o costume dos cristãos de oferecem sacrifícios
em sufrágio dos defuntos, acrescenta:
"Se procurardes
uma lei desta prática, nenhuma achareis escrita; mas a tradição dos nossos
maiores no-la representa como antiga, o costume, a confirma e a fé manda-vos observá-la".
(De coron. Milit. cap. 3 e 4).
Este testemunho de
Tertuliano demonstra que também no século I já se costumava oferecer
sacrifícios em sufrágio dos mortos, visto que ele chama antiga esta prática.
Finalmente temos as
catacumbas, que remontam aos primeiros séculos, onde se leem ainda hoje nos
túmulos dos mortos estas ou outras semelhantes inscrições:
"Deus refrigere o
teu espírito; Vitória descanse em paz o teu espírito; Casemiro, conceda-te
Cristo a luz eterna".
Todos estes
testemunhos mostram que desde a idade dos apóstolos, os cristãos sempre
costumavam rezar pelos mortos e por isso mesmo, mostram também que os cristãos
sempre acreditaram na existência do Purgatório, visto que os eleitos não tem necessidade
alguma de nossas orações; e aos réprobos não podem ser úteis.
Mas — dizem os
protestantes — não esta escrito (I de S. João 1, 7) que o sangue de Jesus nos
purifica de todo pecado?
Sim, esta escrito.
Eis, porém, a resposta.
Quando cometemos um
pecado ofendemos a Deus e merecemos um castigo.
Ora, o sangue de Jesus
Cristo, se nos arrependermos de nossos pecados e os confessarmos, nos perdoa a
ofensa e, por conseguinte, também nos livra da pena eterna; já que Deus,
perdoando a uma alma, lhe restitui a sua amizade e uma alma amiga de Deus é
impossível que seja condenada ao fogo eterno. Este sangue, porém, nem sempre
nos dispensa de sofrer uma pena temporal pelos pecados cometidos. Por isso se
uma alma sair deste mundo, sem ter pago à divina justiça esta pena temporal, vai
pagá-la no Purgatório.
Davi tornou-se
homicida e adúltero. Tendo sido advertido por Natan, arrependeu-se e exclamou:
"Pequei contra Deus". Natan lhe replicou: "O Senhor perdoou o
teu pecado, não perecerás". Portanto a ofensa e o castigo eterno lhe são
perdoados; mas notai bem que este castigo eterno é substituído por uma pena
temporal: "Todavia, acrescentou o profeta, como deste aos inimigos do
Senhor ocasião de blasfemar por esta razão o filho que te nasceu morrerá".
(II Reis, 12).
De outra vez, o mesmo
Davi cometeu um pecado de vaidade, querendo saber de quantos súditos era
soberano, e o profeta Gad lhe deixou a escolher entre a guerra, a fome e a
peste, ainda que o seu pecado já lhe tivesse sido perdoado. (II Reis 24, 12).
É, pois, a própria
Bíblia que nos ensina a fazer no pecado a distinção entre a ofensa e a pena; é
a própria Bíblia que nos ensina que podemos alcançar de Deus o perdão da ofensa
e da pena eterna sem que possamos ser dispensados de sofrer uma pena temporal.
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ÍNDICE
I — A verdadeira regra
de fé
II — Regra de fé
protestante
III — A verdadeira
Igreja
IV — Perpetuidade do
primado
V — Infalibilidade do
Papa
VI — Os Sacramentos
VII — O Batismo
VIII — Confirmação ou Crisma
IX — A Eucaristia —
Palavras da promessa
X — A Eucaristia —
Palavras da instituição
XI — A Eucaristia e a
tradição
XII — A comunhão sob
as duas espécies
XIII — O santo sacrifício da missa
XIV — Confissão — Palavras da instituição
XV — Confissão — sua instituição divina provada
pela tradição e pela razão
XVI — Extrema Unção
XVII — Ordem
XVIII — O Sacramento
do Matrimônio
XIX —
Indissolubilidade do matrimônio à luz da fé
XX — Indissolubilidade
do matrimônio à luz da razão
XXI — O culto de Deus,
dos Santos e das imagens
XXII — Intercessão da
Virgem Santíssima e Santos
XXII — Divina
maternidade de Maria
XXIV — Virgindade de
Nossa Senhora
XXV — A Imaculada
XXVI — O Purgatório
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Autor:
Frei de Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur:
Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora:
Paulinas - 3 Edição - 1955
Fonte
Livro(PDF):
Frei Damião - Em Defesa da Fé <http://alexandriacatolica.blogspot.com.br/2014/04/o-peregrino-de-deus.html>
Para
citar este artigo
BOZZANO,
Frei Damião. Em Defesa da Fé: XXVI. Purgatório + Índice do livro. Disponível em
<http://amigos-catolicos-evangelizadores.blogspot.com/2016/06/0063-purgatorio.html>
Desde 17/06/2016.
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