sexta-feira, 17 de junho de 2016

XXV – A Imaculada

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XXV – A Imaculada
Frei Damião de Bozzano
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Criando Deus os nossos primeiros pais, além dos dons da natureza, concedeu-lhes também outros dons gratuitos e principalmente lhes infundiu a graça santificante, pela qual se tornaram seus filhos adotivos e herdeiros do céu. Esta graça deveriam eles transmiti-la aos seus herdeiros, mas com a condição de que se mantivessem e Lhe obedecessem.

Instigados por Satanás desobedeceram e por isso perderam esta graça tanto para si mesmos como para nós também. Jesus veio para no-la restituir e para tal fim derramou todo o seu Preciosíssimo Sangue. Note-se, porém, que essa graça não nos é infundida desde o primeiro instante da nossa existência, mas somente ao recebermos o santo Batismo. Esta privação da graça santificante, na qual todos somos concebidos, é justamente o que se chama pecado original e que todos contraímos, por sermos filhos de Adão e Eva.

Criatura alguma foi preservada deste pecado? Sim. Dele foi preservado Nossa Senhora e isto é o que queremos significar quando a chamamos de Imaculada. Ela não contraiu o pecado original em vista dos merecimentos de Jesus seu Filho; portanto, isto quer dizer que desde o primeiro instante da sua existência foi bela e santa aos olhos de Deus.

Eis o que vou demonstrar e para proceder com a maior clareza possível, dividirei o tema em dois pontos: 1° Era conveniente que Deus preservasse Maria do pecado original: 2° E de fato A preservou.

Sob todo que qualquer aspecto que consideremos a Virgem SSma. Sempre aparece como sumamente conveniente a sua Imaculada Conceição. Estavam as três pessoas divinas empenhadas em conceder a Maria este privilégio. Vejamo-lo, começando pela primeira pessoa.

Desde toda a eternidade o Pai Celestial predestinara Maria a ser Mãe do seu Filho Unigênito, logo a vinculava a si de modo em extremo admirável, chamando-a a compartilhar consigo da suprema honra de gerar a Jesus Cristo. E Nela já via um principio, um começo de seu Filho humanado; Nela; pois; já O amava.

É possível que a consentisse, mesmo por um único instante, escrava do demônio e manchada de pecado?

Não, a própria razão se revolta ante semelhante suposição.

Além disso, predestinando-a o Pai Celestial para ser Mãe de Jesus Cristo a associava à obra redentora, afim de que tivesse na ordem da reparação o lugar que Eva teve na ordem da nossa ruína, espiritual: Eva cooperou com Adão para nos arrastar à perdição e assim também deveria Maria cooperar com Jesus para nos remir.

Mas, pergunto eu, como teria Ela podido, honrosamente cooperar na redenção dos homens se tivesse sido escrava de satanás?

Eis porque a primeira pessoa da SSma. Trindade, o Padre Eterno, estava empenhado em preservá-la do pecado original.

A segunda pessoa não o era menos.

De fato, desde toda a eternidade elegia Maria por sua Mãe.

Ora, se a um homem fora dado escolher a própria mãe, quem ao invés de Rainha, a escolheria escrava? ou podendo tê-la nobre, a escolhesse vil? ou podendo tê-la amiga, a escolhesse inimiga de Deus? Ninguém; pois a natureza nos leva sempre desejarmos para nossa mãe todo o bem possível. Portanto o Filho de Deus que pode escolher a própria Mãe, a seu bel prazer, sem dúvida a escolheu tal qual convinha a um Deus.

Mas a um Deus puríssimo, convinha uma Mãe puríssima, isenta de toda culpa. Fê-la, portanto, puríssima, isente de toda culpa, escreve S. Bernadino de Sena.

Isto melhor ainda se compreenderá, se considerarmos que a honra ou a desonra dos pais resulta em honra ou desonra dos filhos.

Ora, que desonra não seria para Maria ter contraído o pecado original e por isso mesmo ter sido escrava de Satanás? Conta-se que o rei Abimeleque ao dar a liberdade à sua escrava Sara, lhe disse: "estás livre; lembra-te, porém, de que fostes minha escrava". Com muito maior razão repetiria Satanás à Maria estas palavras humilhantes, se tivesse Ela contraído o pecado original. "Eu vos liberto, mas lembrai-vos de que foste minha escrava: esmagareis a minha cabeça, mas não esqueçais de que meu foi o principio da tua existência; minhas foram as primícias da vossa vida". Palavras desonrosas para Maria! Desonra esta que teria redundado na desonra do próprio Jesus Cristo. É possível que Ele permitisse semelhante coisa? Não, absolutamente não.

Devia, pois, criar a própria Mãe isenta do pecado, sem dependência alguma do demônio, toda santa e imaculada. E assim de fato a criou.

Portanto, como se vê, o Filho, assim como o Pai Celestial, estava empenhado em preservar Maria do pecado original.

E o Espírito Santo não estava nisto igualmente empenhado? Reflitamos um pouco.

Ele deveria com o sangue da Virgem SSma. plasmar a humanidade de Jesus Cristo.

Teria, pois, podido permitir que o demônio profanasse aquele sangue? Possuísse, mesmo por um só instante aquele coração, que haveria de escolher por seu santuário, seu jardim de delícias?

Não, impossível admiti-lo. Fê-la, pois, imaculada, isenta da culpa de origem.  "A torrente do pecado — escreve S. Francisco de Sales — se deteve, assim como se detiveram as águas do Jordão à passagem dos Israelitas. Diante do Maria se retiraram-se as águas turvas do pecado, respeitando e temendo a presença do verdadeiro tabernáculo da eterna Aliança". Todas estas razões, porém, demonstram apenas a conveniência de que se impunha de ser preservada Maria SSma. do pecado original. De fato foi preservada? Foi. É testemunha disto a Sagrada Escritura.

Depois que nossos primeiros pais desobedeceram e perderam o estado de inocência, Deus os chamou às contas. Primeiro perguntou a Adão porque Lhe tinha de desobedecido, e este se desculpou, acusando a Eva. Em seguida, perguntando a esta Lhe tinha desobedecido, disse-lhe a mesma que fora seduzida pela serpente. Então pronunciou Deus a sentença contra os três e quando chegou a vez da serpente, disse:

"Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua posteridade e a dela. Ela te esmagará a cabeça".

Segundo a interpretação comum dos Padres e Doutores da Igreja, a serpente aqui é o demônio e a mulher é Maria SSma.; a semente do demônio é o pecado e a posteridade da Virgem SSma. é Jesus Cristo.

O texto, como se vê, afirma que não somente haverá inimizade entre o demônio e a Virgem SSma. mas também que esta inimizade perdurará entre a semente do demônio e a posteridade da Virgem. Pelo que se cumpre afirmar que é a mesma inimizade que existe entre Jesus e o demônio e entre Nossa Senhora e o mesmo.

Ora, perpétua foi a inimizade entre Jesus Cristo e o demônio.

O mesmo, pois, devemos afirmar da inimizade de entre a Virgem Maria e o demônio. Por conseguinte, desde o primeiro instante da sua Conceição foi dele inimiga, o que é o mesmo que dizer: — foi isenta do pecado, visto que só o pecado é pacto da aliança e amizade com o demônio.

Outra prova da Imaculada Conceição de Maria no-la oferecem as palavras que o Arcanjo S. Gabriel proferiu ao lhe anunciar que deveria se tornar Mãe do Salvador:

"Ave, ó cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre as mulheres".

Que significam estas palavras?

Um recipiente só esta completamente cheio quando já não mais comporta. Se for possível adicionar ao seu conteúdo algo a mais, é indicio de que ainda não esta cheio.

Ora, a Virgem SSma. é chamada cheia de graça por excelência, como se fosse este o seu próprio nome. Portanto recebeu de Deus todas as graças que a uma criatura é dado conter. E por isso mesmo, também foi preservada do pecado original.

Aliás, já não seria a cheia de graça, faltando-lhe pelo menos esta: a preservação do pecado.

A figura deste privilégio de Maria, que mais expressiva me parece é a da Rainha Ester.

Tendo esta Rainha entrado para falar com Assuero sem ser chamada, indo assim, de encontro à lei inviolável dos Assírios, que decretava pena de morte para todos aqueles que sem serem chamados, chegassem à presença daquele rei, dominada por terror incontido diante do extremo rigor da lei, já ia quase desfalecendo, quando Assuero inclinando o cetro sobre ela, disse-lhe: "Não temas Ester, esta lei obriga a todos, mas não a ti".

A Igreja sempre acreditou nesta verdade: Os Santos Padres e Doutores desde os primeiros séculos escreveram sobre a Virgem em tais termos que os seus louvores e as suas declarações exprimem exatamente este singular privilégio. A Igreja o reconheceu, instituindo a festa da Imaculada Conceição e animando os fiéis a invocarem a Maria sob este título. Finalmente Pio IX, aos 8 de dezembro de 1854 proclamava a Imaculada Conceição de Maria, verdade e dogma de fé, com esta solene definição: "Para glória da SSma. Trindade, Padre, Filho e Espírito Santo; pela autoridade de Jesus Cristo, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e nossa, declaramos, decretamos, definimos ser verdade revelada que a Virgem SSma. por singular privilégio e graça de Deus, em vista dos merecimentos de Jesus Cristo, Redentor do gênero humano, desde o primeiro instante da sua Conceição foi preservada da culpa original".

Com esta solene definição, como é claro, não criou o Papa um novo dogma, mas apenas reconheceu e declarou ser a Imaculada Conceição de Maria uma verdade revelada por Deus e universalmente admitida pela Igreja.

E a palavra do Papa teria sido bastante, para nós pois sabemos que, quando ele fala como pastor e mestre supremo dos fiéis e define verdades de fé e de costumes, é infalível, isto é, não pode errar. Contudo Nossa Senhora para dos seus filhos ainda mais confirmar a fé, quis com a sua palavra augusta fazer eco à palavra infalível do Papa.

Na pequenina e pitoresca cidade de Lourdes, ao sopé dos Pirineus, uma menina de 14 anos, Bernadete de Soubirous, juntamente com outras companheiras, perambulavam pelos arredores da gruta de Massabielle, em busca de lenha. Enquanto a inocente criatura se dispunha a atravessar um cristalino e cantante regato, eis que se vê envolvida por uma impetuosa rajada de vento. Atônita, maravilhada volve os olhos em derredor e vê que o roseiral silvestre, que com os seus longos ramos despojados de folhas adornava a base da gruta, era grandemente agitado por uma suave viração.

Enquanto Bernadete estática contemplava o roseiral ligeiramente ondulante, eis que se ilumina a gruta de uma claridade celestial e envolta naquela luz deslumbrante resplandece uma beleza incomparável sob a forma de uma graciosa senhora, revestida e cândida veste, cingida de uma faixa azul celeste, que, suavemente descendo, Lhe aflora os pés, tendo no céu fixo o olhar castíssimo e pendente das mãos postas um níveo rosário.

Verdadeira visão do paraíso! À pergunta de Bernadete: "Quem sois?" Com voz melodiosa responde aquela Senhora: "Eu sou a Imaculada Conceição".

E desde então Lourdes se tornou célebre em todos os recantos da terra. No sítio em que a Virgem apareceu, ergueu-se uma suntuosa basílica e ali peregrinos de todos os quadrantes do globo invocam a Maria sob o título de Imaculada e alcançam as graças almejadas: os cegos vêem, os mudos falam, os paralíticos andam, os doentes recuperam a saúde.

Tudo isto é irrefutável testemunho de que a visão que teve Bernadete, não foi uma simples ilusão, mas uma verdadeira aparição de Nossa Senhora, que por isso é Imaculada como as suas próprias palavras o afirmaram: "Eu sou a Imaculada Conceição".   
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Autor: Frei de Damião Bozzano, Missionário Capuchinho: Em Defesa da Fé.
Imprimatur: Frei Otávio de Terrinca, ofmcap - 20/08/1953
Editora: Paulinas - 3 Edição - 1955

Fonte

Para citar este artigo
BOZZANO, Frei Damião. Em Defesa da Fé: XXV. A Imaculada. Disponível em <http://amigos-catolicos-evangelizadores.blogspot.com/2016/06/0062-a-imaculada.html> Desde 17/06/2016.

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