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APORIA DA COMUNHÃO: REFLETINDO SOBRE AS SUPOSIÇÕES
Autor: Padre Matheus
Pigozzo | Fonte
Com toda a polêmica levantada no âmbito
eclesiástico sobre a comunhão de recasados, teses se levantam de que a
"Amoris Laetitia" (AL) teria sim indicado um novo modo de proceder
nesse sentido, trazendo como chave principal – acompanhar e discernir – e, após
isso, em alguns casos, não seria errado, mas, ao contrário, até evangélico,
admitir fiéis recasados à eucaristia. Trazem também dentro da tese a ideia de
que o ideal é diferente do real e que, em muitos casos, não se pode dizer que
estas pessoas estão em pecado mortal porque não tem plena consciência e
liberdade, faltando, assim fatores básicos de escolha imputável. Ainda dentro
do pacote, ventilam a ideia de que a Eucaristia é remédio e deve ser dado a
quem está doente, pois, no Evangelho, Jesus tem atitudes de acolhimento e não
de exclusão.
O Pe. Augusto Bezerra, em seu recente artigo,
recordou que a Igreja definiu infalivelmente no Concílio de Trento que não é
proceder de acordo com a vontade divina receber a comunhão em consciência de
pecado mortal: "E para que tão grande Sacramento não seja recebido
indignamente e cause a morte e a condenação, o mesmo santo concílio determina e
declara que aqueles que conscientemente sabem que estão em pecado mortal, por
mais que se julguem contritos, se houver a possibilidade de um confessor, devem
fazer prévia confissão sacramental. Se, pois, alguém pretender ensinar, pregar
ou afirmar pertinazmente o contrário, ou ainda defendê-lo publicamente – por
isso mesmo seja excomungado." (Concílio de Trento – Decreto sobre
Eucaristia – Cap. VIII, 11)
Ora, ao menos objetivamente, deve-se admitir
que é pecado grave recasar-se tendo vínculo válido com outra pessoa, como o
próprio Senhor diz no Evangelho: "Portanto, deixará o homem pai e mãe, e
se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne. Assim não são mais dois, mas
uma só carne. Portanto, o que Deus uniu não o separe o homem. Disseram-lhe
eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la?
Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu
repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim". (Mt19,5-8).
O estado de um divorciado recasado é ao menos
objetivamente contraditório com a Eucaristia, como declarou categoricamente
João Paulo II na – nem tão antiga – "Familiaris Consortio": "Não
podem ser admitidos (à Eucaristia), do momento em que o seu estado e condições
de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja,
significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, um outro peculiar motivo
pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam
induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a
indissolubilidade do matrimônio". (n.84). No entanto, é verdade que pode o
fiel subjetivamente não ter plena consciência de seu erro e também trazer
fatores que atenuem sua culpa. Mas, nesse caso, o papel da Igreja não é o de
deixá-lo na ignorância e na opressão, mas retirá-lo da ignorância em relação à
sua condição e ajuda-lo a superar qualquer dificuldade para estar em
conformidade com a lei divina.
Ensina a moral cristã, sobre o último
argumento, que o sacramento que perdoa os pecados graves é a confissão, sendo,
como foi exposto acima, no trecho do Concílio, inadmissível receber a comunhão
tendo a possibilidade de se confessar e não o fazer. A meu ver, a admissão
destes fiéis à Eucaristia com o mero intuito, às vezes bem intencionado, de
inclusão, acolhida e fraternidade, seria reduzir o sacramento ao mero fator
material-social, não importando se haverá efeito na alma, objetivamente fechada
à graça, e sim somente a todos poderem igualmente entrar em uma fila ritual. E,
sobre a segunda parte do argumento, de que nos Evangelhos vemos um Jesus que
teria uma misericórdia que acoberte o desejo de ficar no pecado, este é
totalmente falacioso. Jesus perdoa e acolhe Zaqueu (Cf. Lc19) que diz:
"devolverei tudo o que roubei"; ama e reanima a pecadora arrependida
(Cf. Jo8), dizendo: "não voltes mais a pecar."; ensina o acolhimento
do Pai ao filho que se arrependeu de ter se enfiado na lama dos porcos (Cf. Lc15).
No entanto, condena veementemente os fariseus que não querem abandonar sua
posição de não abertura à graça divina e à Boa Nova do Reino.
Acho que, com essa aporia levantada, podemos
colocar em destaque o que estava em oblíquo no ensinamento da Igreja; não é um
trabalho fácil, mas podemos mostrar a esses casais que é possível viver na
graça, que é possível viver em comunhão e receber a Eucaristia se eles, por
amor a Deus, não podendo se separar por causa dos filhos, guardam o vínculo que
assumiram anteriormente e se dispõem a viverem como irmãos, sendo pais sem
serem esposos, como também ensina claramente João Paulo II no documento já
citado (Cf. FC n.84). Portanto, se colocam numa atitude de luta pelo céu, mesmo
se tiverem quedas, e conseguirem sair delas gradativamente, sem estabelecer uma
situação de pecado, não desistindo do ideal proposto por nosso Senhor,
diferente do julgamento de, provavelmente, muitos irmãos católicos, ao
refletirem sobre tal doutrina.
Não quero menosprezar o sentimento de ninguém,
não quero ser insensível aos dramas, muitos deles escutados por mim no
atendimento pastoral e trazidos em meu coração. O falo é porque tenho fé nas
palavras de Jesus, porque creio que é possível viver o que Ele nos pede, mesmo
que seja difícil... Ele é misericordioso e vê o nosso sim, a nossa luta, mesmo
que imperfeita. Amar na verdade é exigente; parece ser sem misericórdia, mas,
quando a excluímos, praticamos o maior desserviço aos irmãos. Sorrimos,
abraçamos, mas não nos comprometemos, temos sentimentos superficiais e não
amor. Espero ter podido ajudar na reflexão atual aos fiéis que pedem
explicações e motivar a todos a um compromisso com o Caminho, a Verdade e a
Vida – Jesus Cristo.
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