sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

A APORIA DA COMUNHÃO: REFLETINDO SOBRE AS SUPOSIÇÕES - Pe. Matheus Pigozzo

A APORIA DA COMUNHÃO: REFLETINDO SOBRE AS SUPOSIÇÕES
Autor: Padre Matheus Pigozzo | Fonte

Com toda a polêmica levantada no âmbito eclesiástico sobre a comunhão de recasados, teses se levantam de que a "Amoris Laetitia" (AL) teria sim indicado um novo modo de proceder nesse sentido, trazendo como chave principal – acompanhar e discernir – e, após isso, em alguns casos, não seria errado, mas, ao contrário, até evangélico, admitir fiéis recasados à eucaristia. Trazem também dentro da tese a ideia de que o ideal é diferente do real e que, em muitos casos, não se pode dizer que estas pessoas estão em pecado mortal porque não tem plena consciência e liberdade, faltando, assim fatores básicos de escolha imputável. Ainda dentro do pacote, ventilam a ideia de que a Eucaristia é remédio e deve ser dado a quem está doente, pois, no Evangelho, Jesus tem atitudes de acolhimento e não de exclusão.

O Pe. Augusto Bezerra, em seu recente artigo, recordou que a Igreja definiu infalivelmente no Concílio de Trento que não é proceder de acordo com a vontade divina receber a comunhão em consciência de pecado mortal: "E para que tão grande Sacramento não seja recebido indignamente e cause a morte e a condenação, o mesmo santo concílio determina e declara que aqueles que conscientemente sabem que estão em pecado mortal, por mais que se julguem contritos, se houver a possibilidade de um confessor, devem fazer prévia confissão sacramental. Se, pois, alguém pretender ensinar, pregar ou afirmar pertinazmente o contrário, ou ainda defendê-lo publicamente – por isso mesmo seja excomungado." (Concílio de Trento – Decreto sobre Eucaristia – Cap. VIII, 11)

Ora, ao menos objetivamente, deve-se admitir que é pecado grave recasar-se tendo vínculo válido com outra pessoa, como o próprio Senhor diz no Evangelho: "Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne. Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu não o separe o homem. Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la? Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim". (Mt19,5-8).

O estado de um divorciado recasado é ao menos objetivamente contraditório com a Eucaristia, como declarou categoricamente João Paulo II na – nem tão antiga – "Familiaris Consortio": "Não podem ser admitidos (à Eucaristia), do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, um outro peculiar motivo pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio". (n.84). No entanto, é verdade que pode o fiel subjetivamente não ter plena consciência de seu erro e também trazer fatores que atenuem sua culpa. Mas, nesse caso, o papel da Igreja não é o de deixá-lo na ignorância e na opressão, mas retirá-lo da ignorância em relação à sua condição e ajuda-lo a superar qualquer dificuldade para estar em conformidade com a lei divina.

Ensina a moral cristã, sobre o último argumento, que o sacramento que perdoa os pecados graves é a confissão, sendo, como foi exposto acima, no trecho do Concílio, inadmissível receber a comunhão tendo a possibilidade de se confessar e não o fazer. A meu ver, a admissão destes fiéis à Eucaristia com o mero intuito, às vezes bem intencionado, de inclusão, acolhida e fraternidade, seria reduzir o sacramento ao mero fator material-social, não importando se haverá efeito na alma, objetivamente fechada à graça, e sim somente a todos poderem igualmente entrar em uma fila ritual. E, sobre a segunda parte do argumento, de que nos Evangelhos vemos um Jesus que teria uma misericórdia que acoberte o desejo de ficar no pecado, este é totalmente falacioso. Jesus perdoa e acolhe Zaqueu (Cf. Lc19) que diz: "devolverei tudo o que roubei"; ama e reanima a pecadora arrependida (Cf. Jo8), dizendo: "não voltes mais a pecar."; ensina o acolhimento do Pai ao filho que se arrependeu de ter se enfiado na lama dos porcos (Cf. Lc15). No entanto, condena veementemente os fariseus que não querem abandonar sua posição de não abertura à graça divina e à Boa Nova do Reino.

Acho que, com essa aporia levantada, podemos colocar em destaque o que estava em oblíquo no ensinamento da Igreja; não é um trabalho fácil, mas podemos mostrar a esses casais que é possível viver na graça, que é possível viver em comunhão e receber a Eucaristia se eles, por amor a Deus, não podendo se separar por causa dos filhos, guardam o vínculo que assumiram anteriormente e se dispõem a viverem como irmãos, sendo pais sem serem esposos, como também ensina claramente João Paulo II no documento já citado (Cf. FC n.84). Portanto, se colocam numa atitude de luta pelo céu, mesmo se tiverem quedas, e conseguirem sair delas gradativamente, sem estabelecer uma situação de pecado, não desistindo do ideal proposto por nosso Senhor, diferente do julgamento de, provavelmente, muitos irmãos católicos, ao refletirem sobre tal doutrina.

Não quero menosprezar o sentimento de ninguém, não quero ser insensível aos dramas, muitos deles escutados por mim no atendimento pastoral e trazidos em meu coração. O falo é porque tenho fé nas palavras de Jesus, porque creio que é possível viver o que Ele nos pede, mesmo que seja difícil... Ele é misericordioso e vê o nosso sim, a nossa luta, mesmo que imperfeita. Amar na verdade é exigente; parece ser sem misericórdia, mas, quando a excluímos, praticamos o maior desserviço aos irmãos. Sorrimos, abraçamos, mas não nos comprometemos, temos sentimentos superficiais e não amor. Espero ter podido ajudar na reflexão atual aos fiéis que pedem explicações e motivar a todos a um compromisso com o Caminho, a Verdade e a Vida – Jesus Cristo.

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