Livro: «O Inferno
Existe - Provas e Exemplos»
CAP. 3 - TESTEMUNHAS DE ALÉM-TÚMULO
Servo
de Deus Pe. André Beltrami, SDB
Em sua infinita misericórdia, Deus, depois de
haver revelado o dogma do inferno, tem permitido, de onde em onde, que alguma
alma venha da eternidade para confirmar-nos a existência daquele lugar de
penas. Tais aparições são mais frequentes do que comumente se crê; e quando são
atestadas por pessoas idôneas e fidedignas, tornam-se fatos inegáveis, que se
admitem como todos os outros fatos da história. Apresso-me, porém, a declarar
que não entendo trazer esses fatos como argumento principal e básico com que se
demonstre e se estabeleça o dogma do inferno, porque este nos é demonstrado
pela palavra infalível de Deus; narro tais aparições somente para confirmar e
elucidar essa verdade, e como argumento de salutar meditação.
Monsenhor Ségur, no seu áureo opúsculo sobre
o inferno narra três fatos, cada qual mais autêntico, acontecidos não faz muito
tempo.
*
* *
O primeiro, diz ele, sucedeu quase em minha
família, pouco antes da terrível campanha de 1812, na Rússia. Meu avô materno,
o Conde Rostopkine, governador militar de Moscou, era intimamente relacionado
com o general Conde Orloff, tão valoroso quanto ímpio.
Um dia, após a ceia, o conde Orloff e um seu
amigo, o general V…, volteriano como ele, puseram-se a ridicularizar a religião
e sobretudo o inferno:
– Mas…, disse Orloff, e se houvesse alguma
coisa além do túmulo?
– Neste caso…, diz o general V…, o primeiro
que morrer virá avisar o outro; de acordo?
– Pois não, responde Orloff.
E ambos prometeram seriamente não faltar à
palavra.
Algumas semanas após, desencadeou-se um
daquelas guerras que Napoleão sabia suscitar; o exército russo foi chamado às
armas, e o general V… recebeu ordem de partir incontinenti para um posto de
comando.
Duas ou três semanas depois da partida de
Moscou, quando meu avô se levantara, bem cedo, viu abrir-se bruscamente a porto
do quarto e entrar o conde Orloff, com roupa de dormir, de chinelos, cabelo em
desalinho, olhos esbugalhados, pálido como cera.
– Oh! Orloff vós aqui a esta hora? Neste
traje? Que aconteceu?
– Meu caro, responde Orloff, eu perco a
cabeça; vi o general V…
– Oh! Ele já voltou?
– Não, continua Orloff, atirando-se a um
divã, não, não voltou, e é isto que me espanta.
Meu avô nada compreendia e procurava
acalmá-lo.
– Contai-me, então, lhe disse, o que
aconteceu e o que significa tudo isto.
Fazendo grande esforço para se acalmar, o
conde Orloff contou o seguinte:
– Meu caro Rostopckine, não faz muito, o
general V… e eu, juramos que o primeiro que morresse, viria avisar o outro se
há de fato alguma coisa além do túmulo. Ora, pela madrugada, enquanto estava tranquilo
na cama, acordado, sem pensar no amigo nem no juramento, abre-se de repente o
cortinado do meu leito e vejo, a dois passos de mim, o general V… de pé,
desfigurado, com a mão direita no peito, e me fala: “Existe um inferno, e eu lá
estou…” e desapareceu. Na mesma hora corri até cá; eu perco a cabeça! Que coisa
estranha! não sei o que pensar!
Meu avô tranquilizou-o como pôde: falou-lhe
de alucinação, fantasia… que ele talvez estivesse dormindo… que às vezes dão-se
casos extraordinários, inexplicáveis… E procurava persuadi-lo com outros meios
termos, que apesar de nada valerem, servem para consolar os céticos. Mandou
preparar o coche e acompanhou o conde à sua casa.
Dez ou doze dias depois deste estranho
acontecimento, um estafeta do exército comunicava ao meu avô, entre outras
coisas, a morte do general V…
Naquela madrugada em que o conde Orloff o
tinha visto e ouvido, o infeliz general, saindo a estudar a posição do inimigo,
foi varado por uma bala e caiu morto.
“Existe um inferno, e eu lá estou…”
Eis as palavras de um que veio do outro
mundo!
*
* *
O segundo fato é referido pelo mesmo autor,
que o tem por indubitável, como o precedente, pois o ouviu da boca de um respeitabilíssimo
eclesiástico, superior de importante comunidade, o qual por sua vez, soube os
pormenores mediante um parente da senhora, com a qual se deu tal fato. Naquele
tempo, isto é, por ocasião do Natal de 1859, ela ainda vivia e contava pouco
mais de quarenta anos.
Achava-se essa dama em Londres no inverno de
1847 e 1848; enviuvara aos 29 anos, era muito rica e muito amiga dos
divertimentos mundanos. Entre as pessoas elegantes que frequentavam a sua casa,
notava-se especialmente um moço, cujas contínuas visitas a comprometiam não
pouco e cuja vida estava longe de ser edificante.
Uma noite, a senhora lia não sei que romance
para conciliar o sono. Ouvindo bater o relógio, apagou a vela e dispunha-se
para deitar, quando percebeu, com grande assombro, que uma luz estranha e
pálida vinha da porta do salão contiguo e espalhava-se a pouco e pouco no
quarto, aumentando sempre. Não sabendo o que era, do pasmo passou ao medo; eis
senão quando, viu abrir-se lentamente a porta do salão e entrar no quarto o
jovem desregrado, o qual, antes que ela pudesse pronunciar palavra,
aproximou-se, tomando-a pelo braço esquerdo, apertando-lhe fortemente o pulso,
e com aceno desesperado, lhe falou em inglês:
– Existe o inferno!
Foi tão grande o susto que a senhora perdeu
os sentidos. Voltando a si, tocou nervosamente a campainha para chamar a criada,
que a tendeu; entrando no quarto, esta sentiu logo um cheiro de queimado e
chegando-se à ama, que com dificuldade articulava umas palavras pôde ver que
tinha ao redor do pulso uma queimadura tão profunda que a carne desaparecera e
ficava à mostra o osso. Observou além disso, que da porta do salão até o leito
e do leito à porta do salão estava impressa a pegada de um homem, que tinha
queimado o pano de parte a parte. Por ordem da ama, abriu a porta do salão, e
notou que lá terminavam as pegadas no tapete.
No dia seguinte, a desditosa senhora soube
com aquele medo que bem se compreende, que alta noite, o tal moço se embriagara
com excesso, e transportado para casa, veio a morrer pouco depois.
Ignoro, acrescenta o superior, se esta
terrível lição tenha convertido a infeliz dama; o que sei é que ela ainda vive
e para esconder aos olhares curiosos o sinal daquela sinistra queimadura, leva
no pulso, à guisa de bracelete, um largo enfeite de ouro, que não deixa nem de
dia nem de noite. Repito que os particulares eu os tive da boca de um seu
parente próximo, católico sincero, a cuja
palavra presto fé. Os parentes não falam do
ocorrido e é por isso que tenho o cuidado de ocultar o nome da família.
Apesar do véu, no qual esta aparição foi e
deveu ser envolvida, não me parece, acrescenta Monsenhor Ségur, que se possa
pôr em dúvida a formidável autenticidade.
*
* *
O terceiro fato aconteceu na Itália.
Em 1873, em Roma, alguns dias antes da
Assunção, uma moça, bastante má, machucou uma das mãos. Levaram-na para o
Hospital da Consolação. Ou porque o sangue estivesse muito deteriorado ou
porque sobreviesse grave complicação, a infeliz morreu naquela noite.
No mesmo instante uma de suas companheiras,
que não sabia o que acontecera no hospital, pôs-se a gritar desesperadamente, a
tal ponto que acordou toda a vizinhança e provocou a intervenção da polícia.
A companheira que morrera no hospital
apareceu envolvida em chamas e lhe disse: –“Estou condenada, e se não queres
condenar-te também, sai deste lugar infame e volta a Deus.”
Nada consegui acalmar a agitação da jovem,
que bem cedo abandonou aquela casa, deixando a todos atônitos, especialmente
depois de divulgada a notícia da morte da companheira, no hospital.
Aconteceu que, logo depois, a proprietária da
casa, uma garibaldina exaltada, caiu doente, mandou logo chamar um padre,
dizendo que queria receber os sacramentos. A Autoridade Eclesiástica delegou
para esse fim um digno sacerdote, Monsenhor Piroli, pároco de S. Salvador em
Laura. Munido de especiais instruções, ele se apresentou e exigiu, antes de
tudo, que a doente fizesse, perante testemunhas, plena retratação de suas
blasfêmias e insultos contra o Sumo Pontífice e declarasse que afastaria as
ocasiões de pecado. Sem a menor hesitação, a infeliz promete e então se
confessa e recebe o Sagrado Viático com grandes sentimentos de penitência e
humildade.
Pressentindo o seu fim, a pobre mulher, com
lágrimas nos olhos suplicou ao padre que não a abandonasse, amedrontada como
estava por aquela aparição. Assim, teve a grande graça de ser assistida nos
últimos momentos pelo ministro de Deus.
Toda a Roma conheceu logo os particulares
desta tragédia.
Como sempre, os ímpios e os libertinos
fizeram dela objeto de chacota, abstendo-se, à aposta, de obter oportunas
informações; mas, de sua parte, os bons aproveitaram para se tornarem melhores
e mais exatos no cumprimento de seus deveres.
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