Livro: «O Inferno
Existe - Provas e Exemplos»
CAP. 4 - HORRENDOS SUPLÍCIOS DO INFERNO
Servo
de Deus Pe. André Beltrami, SDB
Nenhuma língua humana é capaz de exprimir os
tormentos atrozes daquele lugar de desespero. Como descrever aquele fogo
medonho aceso pela ira de Deus? os remorsos cruéis que dilaceram o mísero
preceito? a eternidade sem fim, com o terrível sempre e o terrível nunca?
Diz Santo Agostinho que o fogo da terra
comparado com o do inferno, parece um fogo pintado; e S. Vicente Ferrer diz que
em confronto com aquele, o nosso é frio.
Gastemos embora páginas e livros inteiros
falando do inferno, acumulemos males sobre males, sofrimentos sobre
sofrimentos, desgraças sobre desgraças, chamemos em nosso auxílio as fantasias
fecundas dos poetas, para idear penas atrozes, peçamos aos tiranos da História
as torturas que inventaram para seviciar as suas vítimas e, apesar de tudo
isso, chegaremos à conclusão de que infinitamente maiores são os suplícios do
inferno.
*
* *
Santa Tereza foi um dia arrebatada em êxtase
e levada ao inferno para ver o seu lugar, caso não se emendasse de certo
defeito.
Ela mesma conta em sua autobiografia:
“Estando um dia em oração, fui transportada,
sem saber como, em corpo e alma, ao inferno. Compreendi que Deus queria
mostrar-me o lugar que ocuparia, se não mudasse de vida. Não tenho palavras que
possam dar uma pequena ideia desse tormento incompreensível. Sentia em minha
alma um fogo que me devorava e o corpo sofria dores insuportáveis. Durante
minha vida passei por duros sofrimentos, mas, nem se comparavam com os que tive
naquela ocasião; e ainda esses subiam de ponto, ao pensar que seriam eternos e
sem o menor alívio. Mas, apesar de as torturas do corpo serem atrozes, não
tinham comparação com as agonias da alma. Ao mesmo tempo, sentia-me queimar e
partir em pedaços, sofria todas as angústias da morte e os horrores do desespero.
Num raio de esperança e de consolação naquela
moradia, aí se respira um odor pestilencial, que sufoca; nem um raio de luz,
mas tudo são trevas da mais densa escuridão; contudo, oh! mistério, mesmo
naquele escuro se distingue o que de mais penoso há para a vista.
Em suma, tudo o que ouvi dizer ou li sobre as
penas do inferno é insignificante em confronto com a realidade; entre aquelas
penas e estas há a mesma diferença entre uma pessoa e o seu retrato. Ai! o fogo
deste mundo por mais ardente que seja, é como o fogo pintado, comparado com aquele
que atormenta os réprobos no inferno.
Há dez anos que tive esta visão, mas estou
ainda agora tão espantada, que, enquanto escrevo, o medo gela-me o sangue nas
veias. Em meio às provocações e dores que tenho, trago à mente esta visão e de
aí tiro força para tudo suportar”.
*
* *
Vicente de Beauvais, no livro 25 de sua
História, refere o seguinte fato, acontecido pleno ano 1000.
Dois libertinos fizeram uma combinação: o
primeiro a morrer viria à terra participar ao companheiro em que estado se
achava. Morreu um deles, e Deus permitiu aparecesse ao amigo: era horrendo,
parecia sofrer duramente e suava em bicas. Enxugou a fronte com a mão e deixou
cair uma gota de suor no braço do companheiro, dizendo-lhe:
– Eis qual é o suor do inferno; dele terás um
vestígio até à morte.
E assim foi, pois aquele suor infernal
queimou-lhe o braço, penetrando na carne com dores inauditas.
Bom para ele que soube aproveitar-se de tão
terrível lição e retirou-se para o convento.
*
* *
Em 1873, Nova Iorque foi teatro de um
incêndio, cujas circunstâncias apresentam a imagem do inferno.
O Circo Baunum foi assaltado pelo fogo;
tigres, ursos, leões e outras feras foram queimadas vivas nas suas jaulas. À
medida que o fogo se propagava, crescia o desespero das feras, sobretudo os
tigres e ursos tornavam-se cada vez mais furiosos. Atiraram-se com supremo esforço
contra as grades, já incandescentes, da prisão, e eram rechaçados quais massas
inertes, para de novo se arrojarem contra o insuportável obstáculo que os
aprisionava.
Os rugidos dos leões, os urros dos tigres e o
aulidos das outras feras se misturavam formando um som pavoroso, que parecia
reproduzirem aquele que devem ouvir os condenados no inferno.
Mas as notas deste tétrico concerto aos
poucos foram-se enfraquecendo, até que, quando o leão soltou o último urro, ao
medonho alarido sucedeu o silencio da morte.
Imaginemos, agora, nestas jaulas de ferro
candente, não as feras, mas homens; e homens que em vez de morrerem no fogo
continuam a viver, e teremos uma ideia do inferno, ideia, aliás, muito
imperfeita.
*
* *
A história registrou, para perpétua
execração, as truculências de alguns tiranos, que mais do que homens pareciam
monstros.
Fálaris, tirano de Siracusa, confeccionou um
touro de bronze para prender dentro os rebeldes e fazê-los morrer a fogo lento,
aceso ao redor. Quem pode descrever os espasmos do supliciado? Gritava,
debatia-se naquelas estreitas paredes, que se tornavam candentes e tormentos
indescritíveis!… Todavia, essas penas terminavam; o condenado terá suplícios
infinitamente maiores e por toda a eternidade.
Nero mandava que se cobrissem os corpos dos
cristãos com pixe e outros combustíveis, e depois, colocados nos postes, ao
longo das alamedas, eram acendidos à tarde, para iluminar, enquanto ele
passeava no coche, insultando-os barbaramente nos padecimentos.
Maxêncio amarrava as suas vítima a cadáveres,
rosto com rosto, tronco com tronco, membros com membros, e as deixava nesse
horrível estado até que o mau cheiro das carnes corrompidas lhes acabasse com a
vida.
Astiáges, rei da Armênia, condenou S.
Bartolomeu Apóstolo a ser esfolado vivo.
Não menos horrível o suplício a que foi
submetido o diácono S. Lourenço. Estenderam-no sobre uma grelha e por baixo
espalharam brasas, de maneira que aos poucos fosse sentindo os ardores e mais
longa e vivamente durasse o tormento. Cozida uma parte do corpo, voltaram-no do
outro lado, para que cada membro tivesse seu sofrimento; e assim neste lento e
atroz martírio, rendeu a alma a Deus.
São talvez esses os suplícios do inferno?
Qual! apenas a sombra, uma pálida ideia.
*
* *
Fala-nos o Padre Nierenberg de um jovem que
levava uma vida aparentemente cristã, mas odiava a um inimigo; e conquanto
frequentasse os Sacramentos, nutria para com ele sentimentos de vingança, que
Jesus Cristo obrigava depor.
Morrendo, apareceu ao pai, todo envolvido em
chamas, e disse-lhe que se condenara por não ter perdoado ao seu inimigo, e
chorando exclamou:
– Ah! se todas as estrelas do céu fossem como
línguas de fogo, não traduziriam os tormentos que sofro.
*
* *
Os dois fatos seguintes se referem propriamente
ao fogo do purgatório, mas não veem fora de propósito, já que os teólogos
afirmam que o mesmo fogo que atormenta os condenados no inferno, purifica também
as santas almas do purgatório, e que o purgatório é um inferno temporário.
Na vida de Frei Estanislau Chosca, dominicano
polonês, lê-se que um dia, quando estava rezando pelos finados, viu uma alma toda
devorada pelas chamas. Compreendeu que se tratava de uma alma do purgatório que
implorava sufrágios, e a interrogou se aquele fogo era mais penetrante que o
nosso.
– Ai de mim! respondeu a mísera, todo o fogo
da terra, comparado com o do purgatório é como um sopro de ar fresquíssimo.
– Mas, isto é impossível! exclamou o frade.
Desejaria mesmo experimentar, com a condição de que isto aproveite para me
fazer descontar aqui uma parte das penas que terei de sofrer, um dia, no
purgatório.
– Nenhum mortal, replicou então aquela alma,
poderia suportar-lhe a mínima parte, sem morrer no mesmo instante, se Deus não
o sustentasse. Se queres converter-te, estende a tua mão.
O dominicano, em vez de intimidar-se ofereceu
a mão: e o defunto deixou cair sobre ela uma gota de suor. Estanislau desmaiou
no mesmo instante, soltando gritos agudos. Acudiram logo os frades assustados e
o encontraram desfalecido e com a mão chagada. Levado para cama e medicado,
recobrou os sentidos; mas não se levantou mais, sempre atormentado por
terríveis dores causadas pela chaga na mão; e morreu depois de um ano, durante
o qual não cessou de exortar os irmãos à penitência para evitarem os rigores da
justiça divina.
*
* *
A aparição que estou para referir é narrada
na vida de S. Domingos, escrita por Fernando de Castelha, e comprovada por um
profundo sinal deixado numa mesa.
Em Zamorra, cidade da província de Leão, na
Espanha, vivia num convento de Dominicanos um bom religioso, ligado em santa
amizade com um Franciscano, homem como ele, de grande virtude.
Um dia que se entretinha sobre coisas
espirituais, prometeram reciprocamente que o primeiro a morrer, se Deus lho
permitisse, apareceria ao outro, para informá-lo da sorte alcançada no outro
mundo. (*Julgo prudente observar que não convém fazer tais acordos; ou pelo
menos é preciso consultar o confessor.)
Morreu o Franciscano e, fiel à sua promessa,
apareceu ao Dominicano, quando este arrumava a mesa. Depois de tê-lo
cumprimentado com extraordinária benevolência disse-lhe que estava salvo, mas,
tinha, outrossim, ainda muito que sofrer por algumas pequenas faltas das quais
não se tinha arrependido bastante em vida. Em seguida ajuntou: – “Nada existe sobre
a terra, que possa dar uma ideia das minhas penas”. E para que o Dominicano
tivesse disto uma prova, estendeu a mão sobre a mesa do refeitório, deixando na
madeira a queimadura como se a mão fora um ferro em brasa, tirado então da
forja.
Imagine-se a comoção do Dominicano a este
espetáculo!
A mesa guardou-se religiosamente em Zamora,
até o fim do século XVIII, no qual as revoluções políticas a fizeram
desaparecer, como a outras muitas relíquias piedosas de que era rica a Europa.
*
* *
Até agora temos falado das penas do sentido;
e que dizer das penas do dano? Que dizer da privação de Deus?
A privação da vista de Deus é o que propriamente
constitui o inferno. Não fazem o inferno as trevas, o mau cheiro, o alarido, o
fogo; a pena que faz o inferno é a pena de ter perdido a Deus. Se Deus
mostrasse a face aos condenados, eles não sentiriam mais nenhuma dor, e o
inferno seria um paraíso.
Apenas a alma rompe os vínculos do corpo,
sente imediatamente que foi criada para Deus e se atira a Ele como uma flecha voa
para sua meta, como a agulha imantada livre do empecilho volta-se para o solo;
mas, estando manchada com o pecado, será repelida e precipitada no inferno.
Um caçador fez uma vez esta experiência:
amarrou o seu galgo com uma grande corrente, dentro do jardim murado, e depois
soltou uma lebre. Apenas a viu, o cão avançou para adentá-la mas é impedido
pela corrente. Que raiva, vê-la correr pelo jardim e não poder apanhá-la!
Ladra, gane, dana-se, morde a corrente para despedaçá-la, atira-se contra o
animalejo que foge dum lado para outro. Fez tanto esforço que pouco depois caiu
morto.
A alma tentará continuamente lançar-se para
Deus, para o qual foi criada, mas o pecado é aquela corrente que não a deixará
sair das chamas cruéis.
*
* *
Um virtuoso sacerdote, enquanto estava
exorcizando um energúmeno, perguntou ao demônio que penas sofria no inferno. A
resposta foi esta:
– Um fogo eterno, uma maldição eterna, uma
raiva eterna e um desespero cruel por não poder mais ver Aquele que me criou.
– Que farias para que te fosse concedido ver
a Deus?
– Para vê-lo, mesmo por um instante, estaria
pronto a sofrer num minuto todas as penas que devo sofrer em dez mil anos… Mas,
vãos desejos, hei de sofrer sempre e não O tornarei mais a ver.
E foi tal o tormento e o desespero com que
pronunciou estas palavras, que deixou funda impressão naquelas que assistiam
aos exorcismos.
» CONTINUA
NO CAPÍTULO 5
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